Numa dessas minhas andanças recentes a trabalho pelo país me deparei com um cidadão extremamente bem falante, educadíssimo, boa cultura, voz mansa, dirigindo um taxi que me levaria de um lado a outro da cidade de Feira de Santana, na Bahia.
Ah… a Bahia… um local único onde a cidadania enxerga o mundo de uma maneira muito interessante, nem sempre correspondendo ao que se vê no dia a dia. Bahia de todos os santos, e demônios também… Mas deixemos o coisa-ruim pra lá, se der pra fazer isso.
Arthur Schopenhauer, em seu livro “Como vencer uma debate sem ter razão alguma” elenca 38 formas de debater, e ser bem sucedido, sem ter razão. É, obviamente, uma fina ironia mas define exatamente o mundo em que vivemos, sem a obviedade: quem assim debate não sabe que não tem razão, muitas vezes.
Foi o caso do dito chofer de praça… Lá pelas tantas, numa dessas interjeições que me marcam (e me atrapalham) lanço uma expressão sem objetivo claro, algo do tipo “isso é coisa de esquerdista”, ou “gripezinha, como a Covid”. Foi o suficiente para, com voz calma, branda e didática, eu ter sido ensinado, entre outras coisas: a)meu negacionismo, com relação à Covid; b)meu erro por achar o Paulo Guedes um bom ministro da economia; c)minha suprema burrice por não enxergar o que claramente se nota – que o preço da gasolina está alto por culpa única e exclusiva dos nossos dirigentes.
Não se iludam os meus (parcos) leitores. Nada foi dito com raiva. Não fui chamado de fascista, negacionista, terraplanista e tudo o mais. A voz branda me “educou” em vários aspectos da minha vida em que eu, obviamente, estou totalmente errado. Num dos momentos áureos da corrida que não durou 20 minutos, foi educado no que significam dados científicos. “Vou lhe dar dados à prova de bala: a Covid mata mais do que qualquer outro vírus – as estatísticas (sei lá de que, nem me lembro) confirmar. É ciência!”. Admiti, claro, que matava, pois é verdade. Mas dizer que mata, e mata mesmo, mas que não seria razão para declaração de pandemia ou “feche tudo” não serviu de nada. Os olhos diziam da tristeza que ele sentia por mim, uma alma condenada ao purgatório, no mínimo.
“O senhor tem que entender que o Paulo Guedes está fazendo uma péssima gestão. Não vê a inflação? Não vê o preço da gasolina? Não vê como a gente está morrendo de fome feito moscas nas ruas?“. No que eu tento (em vão) contra argumentar – mas o que foi possível foi feito, creio, um auxilio de R$ 400,00 para quem não tinha nada é o que se pode fazer num país com orçamento apertado.”… “Seu Wesley, vou lhe ensinar uma coisa – nós somos um país de miseráveis, e R$ 400,00 são esmola…“. Tá ok… fazer o que, ele tem razão, a economia, afinal de contas, a gente vê depois.
Minha irritação sobe na medida em que a vozinha de padre de paróquia vai ficando tanto mais agressiva nos argumentos quanto mais doce e branda no tom. Eu ia perdendo a paciência. A discussão, eu já tinha perdido. No final da corrida o meu professor de economia e saúde ainda me diz “o senhor entendeu“? Eu, obviamente já com cara vermelha digo: “meu amigo, você deveria parar e pensar no que fala, porque dissemina um nível de falsidade que não dá pra tolerar“.
Ponto pro taxista. Bola fora pra mim… vou aprender um dia a ter vozinha de padre, a não perder a calma quando confrontado com argumentos tão “acachapantes” como esses… e depois, de saideira, tive que dar a minha nas costelas dele, às expensas do bondoso e amigo povo baiano, que nada tem a ver com essa situação em particular: “você deve ter razão… afinal, a Bahia há anos vive sob governos tão bons, e tem taxa de desemprego e IDH tao altos”…
Que baixeza da minha parte… não sabendo como “me defender”, aplico um golpe baixo desses… Um dia eu aprendo…
Os idiomas tem uma evolução no tempo, e algumas âncoras. Quanto mais longevo e “estático” é o idioma, significa que mais ciência e regras ele tem. Alguns exemplos, como o Chinês Mandarim, o Grego e o Latim são contundentes. Tão contundentes a ponto de um cidadão grego comum e corrente do Século XXI ter a capacidade de ler e entender, em grande parte, um texto da antiguidade clássica grega, digamos, os Diálogos de Platão.
Âncoras
A âncora do idioma é sua forma culta – ou seja, o fato de que alguém(ns) teve (tiveram) o trabalho de estabelecer uma norma. Enquanto isso não acontece, normalmente o idioma vai espiralando indefinidamente, evoluindo sem controle, tornando cada geração incapaz de entender a anterior, em alguns casos.
O inglês foi uma “criação” de William Shakespeare, Geoffrey Chaucer e outros talentosos escritores, que “amarraram” o barco da língua inglesa em um píer de regras, de onde é mais difícil – mas não impossível – escapar. O alemão foi amarrado ao cais da norma culta por Goethe, o italiano (florentino) por Dante Alighieri, o português por Luis de Camões.
O que esses caras tinham em comum? A necessidade de usar um código de compreensão claro para si e para outros. Um código que permitisse a sua obra sobreviver a mais de uma geração sem precisar de um expert linguístico para fazer toda uma arqueologia sobre o idioma.
É natural que os idiomas escapem das âncoras, pouco a pouco. A função da norma culta não me parece ser a de deixar o idioma estático, mas de permitir que as variações possam ser localizadas no tempo, separando regras de costumes. É importante que os significados evoluam. “Coitado” já foi palavrão, hoje é uma mera interjeição de pena. “Porrada” está a caminho de deixar de ser palavrão para significar soco, pontapé, cacetada… e por aí vai. Isso é uso, e usos mudam. Algumas palavras vão e vêm, como os nomes da moda – Joaquim é um nome que no meu tempo de criança só gente velha tinha. Hoje virou nome de lindos moleques. O mesmo vale pra Alice. Um dia voltaremos a ver de novo os Crisóstomos e as Marlenes de 2, 3 e 4 anos andando pelas ruas.
O que me chama atenção na evolução do idioma, no entanto, é seu caráter popular e voluntário. É um fenômeno de massas. É algo que surge ninguém sabe de onde.
Mudança Forçada
Estamos, no entanto, vivendo um momento diferente, em que estamos diante da decisão, de uma minoria, de impor ao falante uma realidade paralela, em que será obrigado a usar expressões que não nasceram nem da alma, nem do uso, nem do desejo de copiar.
A gente não fala “follow up”, “drivers”, “modus operandi”, “data vênia” ou “savoir faire” porque foi forçado. A gente falar porque algum meio, seja acadêmico ou profissional nos empurrou para tal. A gente não fala “lá em riba” ou “Ôxe” porque foi doutrinado a fazê-lo. Fala porque cresceu falando, e porque os pais nasceram falando. Eu, por exemplo, canso de dizer “Nossa”, sem me tocar que, como batista que sou, não sou necessariamente crente nas graças da mãe de Jesus, como intercessora. É parte da herança.
Alemão, há anos no Brasil, ainda fala “genau”; italiano ainda fala “caspita” e japonês ainda se cumprimenta com um “ohaio” sem nem pensar, às vezes. É a fonte, não imposta, mas incorporada, que vale.
Por que eu deveria me curvar a uma imposição de dizer que sou “neutre” num assunto ou outro, ou aceitar que meu suado canudo de papel da USP venha grafado com “Formandes”, só para agradar alguns que acham que a língua vai mudar a forma que um trata o outro?
Por que eu tenho que responder que sou “Latinx” a um gringo? Até entendo que um transsexual use determinado pronome, que lhe interesse. Não é meu problema. Fale como quiser. Seja o que quiser, e preste contas por isso. Não é força nem violência que mudam a sociedade. Isso inclui a violência linguística, imposta por uma minoria que considero (EU considero, bem dito) sem noção.
Se você quiser falar formandes, latinx, el@ ou elxs, tudo bem. Eu não quero nem vou falar assim, Peço que respeitem meu direito de não fazê-lo. Gosto bastante da norma culta da língua, e a despeito do meu português nem sempre castiço, desejo falar o mais explicadamente possível, ao maior número de pessoas, pelo máximo tempo possível. Quero ser entendido.
Não achemos que a língua vai dar a menor bola para isso. Além de romper com uma regra, nada vai mudar se o povão não incorporar isso como mudança. Claro, é fácil mudar regras quando a população é fundamentalmente iletrada. É mais fácil aqui, entendo, do que em um país de nível cultural mais alto. É mais fácil “caô” ou “zuêra” virarem norma culta do que “elxs”, penso eu – até porque pronunciar certas coisas é mais difícil.
O idioma é âncora e é fator de união. Quem conhece esse brasilsão de norte a sul entende que só nos tornamos nação por causa do nosso idioma. Nossa união passa por nos entendermos. Que assim continue, sem imposições.
Quem, Deus do Céu, vai morar na tenda que o Senhor mandou a gente erguer no deserto? Quem é que vai ser corajoso de viver tão perto de Você? A resposta parece simples, mas no fundo é bem complexa e a gente nem se dá conta disso: quem tem integridade. Quem é justo no que faz, de coração. Quem fala a verdade. Quem não fala mal do alheio. Quem não faz mal aos outros. Quem não calunia os outros. Quem despreza gente que é ruim, mas faz de Deus seu modelo de vida, e tem pavor de desrespeitá-Lo e as Suas Leis. Quem dá a palavra e cumpre a palavra, mesmo que isso cause prejuízo pra si. Quem não cobra juros absurdos dos outros. Quem não faz conchavo ou recebe propina.
Difícil, não? Mas saiba que quem faz isso tudo, JAMAIS vai ter medo de nada. Vai viver de cabeça erguida para sempre.
Pertenço a um grupo de executivos que se reúne mensalmente e debate sobre temas diversos. É como um “Conselho de Administração” coletivo, privado, em que temos a oportunidade de nos apoiar uns aos outros, e usar as experiências coletivas para ajudar e apoiar os outros. É muito bom.
Na base dos “guidelines” do grupo está uma orientação para nunca darmos a nossa opinião, mas contarmos experiências e deixar que o outro chegue a conclusões por si só. Seria uma forma de não ser intrusivos, e não darmos uma de “professor de Deus” aos outros. Confesso que com minha natureza voluntariosa, e profissão, tenho a tendência de sair imediatamente dizendo “se eu fosse você…”. Isso é algo radicalmente contra a tal diretriz.
Recentemente me deparei com um artigo num editorial chamado “Quillette” (www.quillette.com) extremamente interessante, e que dá uma entonação muito diferente ao conceito de “intromissão” e discordâncias. Se chama “Quando discordância se torna trauma” (tradução livre) e pode ser encontrado no link https://quillette.com/2022/05/08/when-did-disagreement-become-trauma/.
O subtítulo é bastante revelador sobre o tema: “How does one deal with those who claim that debate itself represents an agony beyond human endurance?” (“Como é que alguém lida com aqueles que dizem que o debate, em si mesmo, representa uma agonia além da resistência humana?”
A Universidade da Columbia Britânica gestou, por anos, um documento chamado “Anti-Racism and Inclusive Excellence Task Force Report” (Relatório da Força-Tarefa Anti-Racismo e Excelência Inclusiva”), seja lá o que isso de fato signifique. É um calhamaço de 300 páginas em que os acadêmicos defendem o que têm defendido já há alguns anos, e que define um termo: “Truthing” (eu traduziria por “verdadear”, mas o Google traduz como “veracidade”). O termo, vejam, não trata da “verdade” em si, e é definido como
“o ato de afirmar verdades sobre assuntos considerados de conhecimento difícil e/ou perigoso, em contextos de hiperpoliciamento, vigilância e microgerenciamento de organizações racializadas… , e censura que acompanha a veracidade do assunto enquanto simultaneamente aborda as relações de poder e as injustiças que interrogam ativamente o desconforto, a negação, o direito à negação, o apagamento e a censura que acompanha a verdade do assunto.”
Força-Tarefa Anti-Racismo e Excelência Inclusiva da BCU
Fugindo da discussão
É um tremendo esforço para dizer que não se pode expressar ideias, creio eu. Discutir, em “bolhas”, se tornou sinônimo de pecar. Fora da Bolha também. Dentro da Bolha, discutir significa desagregar, por esta definição; significa querem criar caso. Fora da Bolha, significa perda de tempo, num ambiente em que só nos cabe “cancelar” o outro por pensar diferente.
Não se trata de um lado, outro lado, esquerda, direita. Nada disso. Qualquer lado neste mundo tem usado essa mesma abordagem quando algum assunto entra em discussão. Eu concordo? Não discuto; eu discordo? Eu xingo. Não transijo, não tento entender o outro, não promovo o progresso do pensamento. Cancelo e vou-me embora pra Pasárgada, feliz e justificado…
Em síntese – sinta-se bem. Não raciocine nem se preocupe em fingir que se preocupa.
Safe Environments
Volto ao tema inicial – o meu grupo de amigos: estamos no meio do caminho. Não deixamos de discutir; não discutimos, porém. Não damos opinião direta mesmo que instados a isso. Somos os “Ambiente Seguro”. Não que eu me orgulhe disso. Como (supostamente) pensador, gosto de me dar ao luxo de pensar nas coisas – e escrever sobre elas – sob um ponto de vista que muitas vezes até eu mesmo tenho preguiça de fazer, quando em companhia de terceiros.
Gosto, portanto, de pensar que talvez estamos diante de uma incapacidade crescente de contrariar o outro – isso torna o ambiente “unsafe” por expressarmos o que pensamos. As “turmas do deixa-disso”, que antes eram circunscritas às brigas a socos e pontapés, agora interfere em qualquer discussão que passe de uma sequencia de concordâncias – qualquer sinal de que vai “acalorar”, mesmo que da forma mais positiva possível, é motivo para ess turma agir, mudar de assunto, e falar de algo mais light, como futebol, praia, e o tempo.
Eu me vejo de quando em vez sendo “apartado” de discussões como nos tempos do pátio do colégio público de Cordeiro, RJ, quando “rodava a baiana” com alguém, ou alguém o fazia comigo. Discuto e sou tangido a não fazê-lo, e principalmente não me aprofundar em qualquer assunto, mesmo que a coisa possa desaguar em soluções ou apoio legítimo.
Que ambiente “seguro” eu quero, no campo da discussão, “papo cabeça” mesmo, coisa de amigo que bebeu mais do que devia e abre o coração para o outro, que, por também estar doidão, aceita as provocações e conselhos na boa, sem filtros? Eu quero um ambiente em que eu não seja “coagido” mentalmente?
enquanto simultaneamente aborda as relações de poder e as injustiças que interrogam ativamente o desconforto, a negação, a negação, o apagamento e a censura que acompanha a verdade do assunto.
Uma parte do artigo que me choca – mesmo em se tratando do Canadá de Trudeau:
Essa alergia ao desacordo é agora uma característica crescente da vida intelectual em todo o Canadá. Na Mount Royal University, em Alberta, por exemplo, o sindicato dos professores recentemente enviou duas páginas de instruções detalhadas sobre como os professores deveriam se comunicar uns com os outros em um próximo retiro de primavera. Na mensagem de e-mail, vazada para mim por um membro do corpo docente exasperado, o sindicato alertou os membros que as discussões no retiro “podem alcançar o envolvimento em espaços corajosos, embora não totalmente seguros”. A fim de “minimizar os danos”, os participantes foram aconselhados a “falar de nossa própria experiência e não invalidar as experiências dos outros”. Foi-lhes garantido que os moderadores expulsariam qualquer um que violasse intencionalmente essas regras e confortariam aqueles que fugiram de discussões “prejudiciais”. Também havia instruções detalhadas sobre como delatar colegas sindicalistas que se envolveram em falar errado – inclusive por denúncia anônima. Tomado como um todo, o documento é um aviso para todos de que qualquer pessoa que discorde de alguém sobre qualquer coisa pode estar em risco de vergonha pública e sanção oficial.
Johnathan Kay in https://quillette.com/2022/05/08/when-did-disagreement-become-trauma/
Me chama atenção aqui o paralelismo entre a visão de “minimizar os danos”, os participantes foram aconselhados a “falar de nossa própria experiência e não invalidar as experiências dos outros” e a situação que convivemos em nosso ambiente de discussão.
Ora, qual é, então, o limite que o outro está disposto a aceitar para crescer? Isso, obviamente, é decisão de cada um. Sempre se pode levantar e ir embora, se algum limite severo tiver sido ultrapassado. Não interessa que o outro tenha tido a melhor das intenções. Os incomodados que se mudem, dizia-se antigamente. Já não é assim – os incomodados, hoje, mudam a maioria, mudam o mundo, mudam os costumes, os hábitos. Exigem serem chamados de “elxs” ou “querid@s”, exigem ser reconhecidos como negros, sendo brancos, gato, sendo gente, e muito mais.
E agora?
Um texto que recebi recentemente, de um tal
faz um paralelo interessante entre o QI médio da população e a quantidade de palavras usadas, ou habituais. Reproduzo porque é muito interessante:
O QI médio da população mundial, que sempre aumentou desde o pós-guerra até ao final dos anos 90, diminuiu nos últimos vinte anos. É a inversão do efeito Flynn. Parece que o nível de inteligência, medido pelos testes, diminui nos países mais desenvolvidos. Pode haver muitas causas para este fenómeno. Um deles pode ser o empobrecimento da linguagem. Na verdade, vários estudos mostram a diminuição do conhecimento lexical e o empobrecimento da linguagem: não é apenas a redução do vocabulário utilizado, mas também as sutilezas linguísticas que permitem elaborar e formular pensamentos complexos. O desaparecimento gradual dos tempos (subjuntivo, imperfeito, formas compostas do futuro, particípio passado) dá origem a um pensamento quase sempre no presente, limitado ao momento: incapaz de projeções no tempo. A simplificação dos tutoriais, o desaparecimento das letras maiúsculas e da pontuação são exemplos de “golpes mortais” na precisão e variedade de expressão. Apenas um exemplo: eliminar a palavra “signorina/senhorita/mademoiselle” (agora obsoleta) não significa apenas abrir mão da estética de uma palavra, mas também promover involuntariamente a ideia de que entre uma menina e uma mulher não existem fases intermediárias. Menos palavras e menos verbos conjugados significam menos capacidade de expressar emoções e menos capacidade de processar um pensamento. Estudos têm mostrado que parte da violência nas esferas pública e privada decorre diretamente da incapacidade de descrever as emoções em palavras. Sem palavras para construir um argumento, o pensamento complexo torna-se impossível. Quanto mais pobre a linguagem, mais o pensamento desaparece. A história está cheia de exemplos e muitos livros (George Orwell – “1984”; Ray Bradbury – “Fahrenheit 451”) contam como todos os regimes totalitários sempre atrapalharam o pensamento, reduzindo o número e o significado das palavras. Se não houver pensamentos, não há pensamentos críticos. E não há pensamento sem palavras. Como construir um pensamento hipotético-dedutivo sem o condicional? Como pensar o futuro sem uma conjugação com o futuro? Como é possível captar uma temporalidade, uma sucessão de elementos no tempo, passado ou futuro, e a sua duração relativa, sem uma linguagem que distinga entre o que poderia ter sido, o que foi, o que é, o que poderia ser, e o que será depois do que pode ter acontecido, realmente aconteceu? Caros pais e professores: Façamos com que os nossos filhos, os nossos alunos falem, leiam e escrevam. Ensinemos e pratiquemos o idioma nas suas mais diversas formas. Mesmo que pareça complicado. Principalmente se for complicado. Porque nesse esforço existe liberdade. Aqueles que afirmam a necessidade de simplificar a grafia, descartar a linguagem dos seus “defeitos”, abolir géneros, tempos, nuances, tudo que cria complexidade, são os verdadeiros arquitetos do empobrecimento da mente humana. Não há liberdade sem necessidade. Não há beleza sem o pensamento da beleza.
A gramática é a expressão da linguagem. A linguagem é a expressão de pensamento. O pensamento é a expressão de Deus no homem….
Christophe Clavé
Palavras são tão importantes que deveriam ser mais usadas. A pobreza de vernáculo certamente traz consigo a burrice. Não que a riqueza traga necessariamente a sabedoria (um amigo querido costumava chamar um imbecil conhecido de “uma diarreia de palavras e uma prisão de ventre de ideias”). O fato é que os Safe Environments do presente estão deixando as universidades e entrando em nossas casas, via chats, via mídias sociais, via boca de filhos e de pais. Com os Safe Environment está vindo o medo patológico de discutir ideias das quais se discorda.
Tem um site que gosto muito, que se chama Quillette (www.quillette.com). é um site de matérias compridas e profundas sobre temas equilibrados, nas quais sempre há espaço para divergência, seja por parte de alguém mais identificado como “libertário” ou como “conservador”. Muito bom, vale verificar. Neste site li uma matéria ontem que me chamou atenção sobre o nível de alienação do ser humano com relação ao rigor intelectual que deve reger a vida de qualquer um de nós, sob pena de escravidão (à opinião do outro, às finanças do outro, ou simplesmente ao outro, como propriedade).
O Caso do Algoritmo Intolerante
O artigo (acesse em https://quillette.com/2021/01/27/beating-back-cancel-culture-a-case-study-from-the-field-of-artificial-intelligence/) traz um exemplo desconcertante de burrice acadêmica explícita, do nível daqueles que acham que sexo é um construto social e não uma realidade biológica inescapável: em síntese, um sofisticado sistema de IA – Inteligência Artificial foi aplicado em scanners corporais (tomografias computadorizadas, etc) para identificar doenças, mesmo antes de haver qualquer traço delas no corpo do paciente.
Pois bem, apresentado num congresso da NeurIPS (Conferência da Neural Information Processing Systems, ou Sistemas de Processamento de Informações Neurais), o algoritmo usado identificava, além das potenciais doenças e condições genéticas, a RAÇA e cor da pele do cidadão/ã com um percentual de acerto altíssimo. Bastou pro mundo cair na cabeça do Dr. Pedro Domingos, professor da California Institute of Technology.
“Citando evidências, por exemplo, de que “sistemas de reconhecimento facial tem muito mais erros para mulheres de pele escura, enquanto tem muito menos erros para homens de pele clara“, a cientista de dados Timnit Gebru, ex co-líder da Equipe de Ética do Google, arguiu que os sistemas de IA estão contaminados pelo preconceito da maioria de programadores, homens brancos que os os criam [algoritmos]. Num “paper” assinado com colegas do Google e minha universidade [CIT, diz o Dr. Domingo] ela avisou que grande parte dos sistemas de IA baseados na linguagem, particularmente encorajam uma “visão de mundo hegemônica” que serve para perpetuar o discurso de ódio e a intolerância”.
Dr. Pedro Domingos, PhD
Não é piada. Tem gente achando normal dizer de público que um algoritmo que faz parte de um sistema de Inteligência Artificial que está voltado a detectar doenças está contaminado com a “brancura” dos programadores. Ninguém que leu, na cátedra, achou anormal a fala. Pai do Céu! Trata-se de um algoritmo, por amor dos meus filhos! É uma fórmula matemática que se baseia em dados acumulados para tecer uma conclusão via cruzamento desses dados com as imagens produzidas por um scanner ou equivalente! É CIÊNCIA, até onde se pode ver.
Tanto é ciência com C maiúsculo, que os resultados são amplamente corretos – e olha que a tal Inteligência Artificial ainda está aprendendo com as leituras feitas, e que alteram o próprio padrão e algoritmo.
O Estranho Caso do Tratamento Preconceituoso
Vez por outra dá entrada num hospital em algum lugar do mundo um transsexual, um não-binário, um “sei-lá-como-se-chama-e-me-perdoe-de-antemão-por-não-saber” que acaba por receber um tratamento inadequado e que acaba tendo graves complicações porque o pessoal da emergência não conseguir, no fogo da batalha pela vida, identificar o sexo (biológico) do paciente.
Se sexo é um conceito social, e não biológico, não faz diferença tratar a próstata da Srta. Myrella ou o útero do Sr. Adamastor. Fazer diferente disso é intolerância e discurso de ódio. Dá pra entender? De uma vez por todas, IGNORE detalhes e bobagens como XX-XY e resolva meu problema de saúde!
Tratamentos são preconceituosos em sua natureza, ao que parece. Afinal, para tratar alguém com eficácia há que se tomar decisões de cunho iminentemente “bigot” (pra ficar chique). É necessário passar ao largo da modernidade e ir buscar conhecimento em conceitos ultrapassados, como hormônios “femininos” e “masculinos”, e órgãos que são diferentes e funcionam diferentes em pessoas XX e pessoas XY.
O Estranho Caso da Mudança de Gênero sem Trauma
Aprendi na escola que se dizia “Obrigado” e se escrevia “Obrigado” independentemente de se ser homem ou mulher. É (era) uma daquelas palavras que não comportavam masculino, feminino, ou “neutre”. Mulher falava Obrigado, Homem se dizia “Telefonista”. Ninguém fazia a menor conexão dos termos com o sexo de quem os aplicava. Era o que era, sem frescura.
Ao longo dos anos, as mulheres começaram a usar o termo no feminino – “Obrigada”, o que foi estranho, no início, mas foi se incorporando ao vernáculo do português brasileiro até que hoje faz parte da norma. Não houve briga, não houve passeata para reforçar o “a” do agradecimento diário. Houve só uso, sem forçada de barra.
Mais recentemente toda sociedade está sendo impelida a dizer que “todes somes pessoes boes”, ou o que quer que se queira dizer, em linguagem “neutra”. Usar o masculino ou feminino, ou ambos “todos(as) somos pessoas boas” já não basta. Saber que “pessoas”. “somos” e “boas” não tem qualquer implicação de gênero já não basta. É importante marcar uma posição. Não importa quão ridícula, ou o quanto dificulta o entendimento diário.
Línguas evoluem de acordo com o conforto de quem as usa. É mais confortável? Faz mais sentido prático? Não é ambíguo? Usa-se e ponto. O uso consagra. Não mais… para onde vai a praticidade da língua, ou da Novilíngua, sendo mais Orwelliano, não importa.
É burrice mesmo
Mas no fundo, no fundo, é burrice mesmo. É querer complicar as coisas indevidamente. Pior, é criar uma situação de tal forma ridícula, que os possíveis beneficiados com a intenção de quem age (o guerreiro social) vejam o tiro sair pela culatra.
É burrice tornar as expressões ambíguas. É burrice tornar os diagnósticos e tratamentos mais difíceis. Enfim, é burrice trocar um algoritmo por um sentimento. Uma ponte cai se mal construída, não importa o sentimento do engenheiro calculista quanto à equação que usa, ao botar no papel a largura dos pilares da estrutura. Cai e ponto. E cai a 9,8 m/seg². A gravidade não mudará porque hoje estou “me sentindo leve”. Pule da ponte alegre e você verá, até não ver mais.
Enfim, é burrice não ver evidências claras de que é preciso testar fórmulas antes de usa-las, é preciso usar remédios testados; não é terraplanismo achar que uma droga experimental é isso mesmo – experimental. Independentemente da relação custo X benefício que nos leva a usá-la. Não é negacionismo achar que há que se ter cuidado em vacinar crianças, por conta da mesma relação custo X benefício. É prudência somente. Me vacinei porque julguei que o custo de não me vacinar superava o benefício de não ter a droga no organismo. Da mesma forma, não vacinaria um filho abaixo de 12 anos por conta do mesmo raciocínio feito na mão inversa.
A burrice só é extirpada com consciência de que testar, estudar, conversar e refletir são atos a serem exercitados diariamente, sem parar e sem descanso. E olha que burrice vai e volta. Se deixo de refletir e pensar por alguns dias, fico mais burro, com certeza. Ou burro sobre um assunto diferente (quando aliás tendo a expressar minha opinião sem reservas…).
Num mundo em que a capacidade de reflexão e tomada de decisões do indivíduo estão sendo substituídas por um Estado-Pai que não admite decisões privadas, mas que enfia um modelo padrão a todos, a burrice só tende a aumentar, sem que possamos sequer saber se aqueles que criam o modelo padrão têm o mínimo de bom senso para fazê-lo.
Eu pareço um zé-ninguém mesmo… nem Deus liga pra mim… se Ele fosse capaz de esquecer de algo, eu diria que se esqueceu mesmo foi de mim! Não liga pra mim, Divindade? Como sempre tem gente querendo meu mal. Tem gente que me odeia, e às vezes eu nem sei bem por que… Até quando você, Deus, vai deixar que esse povo me odeie? Eu fico num bode, num calundu, numa tristeza de dar (des)gosto… Como diria meu filho Ettore, o famoso Tóia – “Ola pla minha cala”, Deus! Deixa eu enxergar o futuro, porque não vejo um palmo adiante do nariz! Eu não quero morrer agora, sem realizar nada; Depois eu morro, e aí os meus inimigos vão dizer que ganharam de mim. Vão ficar todos prosas, se achando, e eu terei perdido essa “peleia”. Mas tudo bem, como sempre. Eu confio que o Senhor vai fazer o melhor, não importa quanta assombração me apareça. Eu confio em Deus e ponto final. Eu reclamo, reclamo, brigo com Deus e fico brabo, mas no final das contas, Senhor, eu só tenho mesmo é que agradecer!
Sinecura significa “Sem Cuidado” (do latim – sine, “sem” e cura, “cuidado”), de acordo com a Wikipédia. O nome era dado a um emprego ou função que era só uma desculpa pro sujeito “mamar” em alguma teta. Estatal ou não, sem trabalhar – ou seja, receba, sem qualquer cuidado, pois você não tem responsabilidade alguma. Só recebe.
O Brasil não inventou a sinecura. Na Inglaterra dos séculos XVI ao XIX, as sinecuras eram formas de reconhecimento dos reis aos seus súditos fieis, por conta de algo que tivessem feito (merecida ou imaginariamente). A Roma antiga, onde o termo se originou, não foi nem de longe a inventora da prática, embora tenha tornado o termo famoso. E lá as sinecuras eram, pelo menos, entendidas pelo que realmente eram – benesses com o dinheiro alheio.
A famosa Companhia das Índias Orientais, ou “John Company”, na gíria da época, era uma empresa privada com características e poder muito parecidos ao de alguns países. A John Company foi mais rica e mais poderosa do que a maioria dos reinos europeus da época, e também distribuía suas sinecuras.
A prática, portanto, não nasceu em terras e reinos católicos, embora tenham se tornado uma forma de arte, quando os países protestantes da Europa, e os EUA, já tinham praticamente banido a prática, em fins do Séc XIX. Claro que banir é um termo forte, já que em pleno Séc. XX vimos a repetição disso tanto na Inglaterra, Holanda, EUA e outros locais.
O costume chegou ao Brasil com as caravelas de Cabral. Pero Vaz de Caminha aproveita a famosa cartinha a El Rey para solicitar uma sinecurinha pra um cunhado, se não me falha a memória… e daí viemos: de sinecura em sinecura.
A modernidade da Sinecura
O Estado moderno e sua impessoalidade tende a coibir as sinecuras, sob a alegação de que cada trabalho merece sua paga, e não pode existir paga sem trabalho que o justifique. Isso, longe de significar o fim da prática, implicou em sua sofisticação.
Hitler, na Alemanha Nazista, formou um time de “Sinecuristas” de alto coturno, composto de empresas como Basf, Bayer, Heinkel, etc, que ajudaram no esforço de guerra alemão em troca de uma sinecura chamada monopólio. Aliás, essa é, na minha opinião, a única diferença entre um estado comunista e um estado fascista- a existência desses monopólios ou oligopólios, no fascismo, contra um estado todo-provedor e empreendedor, no comunismo “raiz”.
Lula, e seu partido, fizeram algo semelhante, muito mais recentemente, com a política dos “campeões nacionais”, que elegeu empresas para serem vitoriosas no mercado, como JBS, Odebrecht, etc. A troca parece funcionar bem, já que a JBS, por exemplo, acabou se tornando mesmo um campeão nacional, e mundial até, com seu gigantesco faturamento e sua competência na produção de proteína animal.
Nada disso, porém, parece ajudar o país. Em troca de qualquer sinecura, de um empreguinho estilo “rachadinha” num gabinete de vereador no interior até o recebimento de zilhões em empréstimos do BNDES a juros baixos e à custa de deixar outro zilhão de empreendedores sem financiamento (1), o mercado se desalinha e acaba empobrecendo como um todo. Mas esse não foi nem o pior exemplo de sinecura recente. Pior do que financiar um empreendedor nacional é financiar um estado (no mais das vezes totalitário ou quase) com esse mesmo dinheiro da população, sob a certeza de que o pagamento não viria – e na época, não importava se viria ou não.
A Negociata – a Sinecura Nossa de Cada Dia
Assim como a cerveja da 6a. feira, com aquele torresminho, e um pagode, o desejo pela sinecura do dia-a-dia está enraizada aqui, e precisa ser extirpada a golpes de facão.
“Negociata é todo bom negócio para o qual não fomos convidados”.
Barão de Itararé
Apparício Torelly, o Barão de Itararé citado acima, era um humorista e escritor do início do século, famoso por seu humor ácido e tiradas geniais. entre outras, disse pérolas que se confirmam a cada dia, piada ou não: “O homem que se vende recebe sempre mais do que vale.” ou a célebre “O tambor faz muito barulho mas é vazio por dentro.” entre outras dezenas de frases geniais.
A negociata é a sinecura com meia contrapartida: não é totalmente “sine” (sem), e dá algo de “cura” (cuidado), mas normalmente dá mais lucro. É o outro lado da alma brasileira – se não dá pra receber sem fazer absolutamente nada, “vende-se” algo por um preço um tantinho maior, pagando algo pra cada agente do processo, e até se entrega algo, a depender do grau de vigilância da sociedade. Os hospitais de campanha da Covid 19 me cheiram muito a essa classe de sine-quase-cura: contrato na crise, sem licitação, pago milhões, não uso, descomissiono assim que posso, todo mundo fica com a impressão de que algo foi feito, e nada.
Durante a tragédia em Nova Friburgo e região, em 2011, se não me falha a memória, prefeitos receberam do Governo Federal milhões para aliviar o sofrimento das vítimas. Os prefeitos (mais de um) são acusados de embolsar a grana toda – uns R$ 300 milhões e não fazer nada. Se embolsaram, não sei. O que sei é que qualquer chuvinha maior no centro da cidade provocava alagamentos, por conta do assoreamento das manilhas de águas pluviais.
Eu com isso…
A tendência, como o saudoso Barão já falava, é a de que nós nos importemos somente quando não somos nós o objeto de tão grande benesse. Se estou no meio, às favas a moral. Vimos corruptos, há alguns anos, agradecendo a DEUS (Aiaiai!) pela propina recebida, que era “desejo divino”. Como cristão evangélico, minha vontade é a de que a teologia da “queda da Graça” fosse verdadeira, e esses aí fossem do céu direto pro inferno. Não posso arguir isso…
O fato é que requer grandeza moral para não aceitar nem propor sinecuras ou negociatas. O ser humano em geral, e o brasileiro em particular, são mestres em arrumar desculpas e explicações para seus malfeitos. Ora é “porque todo mundo faz mesmo”, ora é “porque preciso”, ou ainda porque “é por uma boa causa”.
Grandeza moral se aprende no berço, com pais igualmente morais, ou mesmo que imorais, que reconheçam isso e incutam nos filhos o desejo de que eles não sejam iguais aos próprios pais. Levar (ainda que arrastados) para a igreja e escola ajuda muito. Segregar de amizades ruins era a marca do pai de antigamente; não é mais. Grandeza moral, porém, é algo que nem sempre os filhos aprendem. Para isso, infelizmente, as consequências sociais deveriam ser duras e imediatas. Não o são: hoje a leniência com o “pobre do menino de 16 anos que matou 4” tem sido a marca de uma sociedade que no fundo ama a sinecura, o mal-feito, a negociata e deseja que as punições não ocorram. Algo diabólico.
Estamos longe de extirpar o mal e as sinecuras permanecem nos mesmos gabinetes legislativos, nas mesmas varas cíveis e criminais, nas mesmas escolas e universidades, no bar da esquina, na fila do ônibus, na repartição pública, e por aí vai.
Educação? Leis duras? Fortalecimento da família? Igrejas e Templos? Tudo isso junto ajuda. Temos uma luz no fim do túnel? Não sei – acho que não pois “o mundo jaz no maligno”. Tenho esperança? Poucas. Vamos resolver o problema? Não creio. Pessimista? Muito.
Eu creio em Deus, porém, e sei que Ele é quem detém o controle da humanidade, a quem dá livre-arbítrio, mas que também teu o Seu. Esperemos pelo melhor, desconfiando, mas esperemos.
(1) A injustiça desta prática é menos aparente, pois parece que o governo simplesmente tem o dinheiro e empresta a quem quer – como devedor líquido e pagador de juros, o dinheiro que vai para o BNDES e que acabou alimentando os campeões nacionais acabou sendo financiado a juros de mercado, em títulos da dívida, a custo significativamente maior. Sou contra a existência de bancos estatais de qualquer natureza, inclusive de fomento, mas entendo o xodó que o mercado tenha por eles, em um país de juros altos e crédito difícil.
Socorro, acode, Senhor...
Tem malandro demais nesse mundo!
Ninguém faz mais o que presta,
Só tem mentiroso, ladrão, vagabundo...
Se o cara abre a boca, ja tá mentindo,
Corta fora o beiço dos caras, Senhor!
Cala a boca de toda essa corja, é o que resta
Essa gente que engana e não tem temor!
Quem vai pelo mundo criando tristeza
E faz da vida do pobre um horror
Pode crer que não vai demorar
Pra Deus dar um fim a você, malfeitor.
Deus vai nos livrar de você, malandragem,
Mas nós sabemos que tem muita gente
Que adora enganar, e ser enganado
Dá ouvidos a promessa, de político que mente.
Socorro, acode Senhor...
Versão em Prosa – pra parte do Jogral:
Socorro, acode, Senhor…Tem malandro demais nesse mundo! Todo mundo só quer se dar bem. Ninguém mais liga pra fazer o que presta. Só tem mentiroso (tanto no tempo de Davi como hoje! – Nota do Adaptador). Abriu a boca, pode contar que tá enrolando, puxando saco, mentindo. Pode parecer cruel, mas que Deus corte fora a língua de quem é assim – pode até ser figurativamente… Esses caras vão pelo mundo achando que engalam todo mundo na lábia, e falam abertamente: quem é que manda na minha boca? O povo mau vai pelo mundo fazendo o pobre sofrer, mas Deus falou que vai dar um fim nesse estado de coisa. Deus só fala coisa boa, honesta que nem ouro e prata puros. Ele falou, não tem erro! Pois é… a gente sabe que Deus vai tomar conta de nós; e vai nos livrar da malandragem pra sempre. Mas é claro que tem gente ruim em todo lado, e que no fim das contas tem um monte de gente que acha bacana gente que fala bonito, promete tudo, não mede palavras pra agradar, mesmo que no fundo só queira uns votos… ou uma grana.
Nota: a brincadeira com o “samba enredo” e o jogral é pra lembrar que Salmos, na verdade, significam “cânticos” de louvor, e eram coletâneas de músicas que provavelmente eram entoadas em cultos a Deus… e ainda são!O Samba enredo é pra curtição mesmo… o jogral é pra nós imaginarmos a criançada da igreja falando, no intervalo das estrofes, ao som de uma cuíca, baixinho, ao fundo…
“Deus abençoe” tem sido o meu “motto” quando falo com pessoas, às vezes até com quem não tenho muita intimidade. Procuro pensar no que vou falar, e falar porque realmente desejo a bênção de Deus sobre a pessoa.
De uma forma geral, mesmo que é agnóstico não se importa com meus bons desejos. É o normal. Se alguém me diz “Nossa Senhora te abençoe”, eu, que sou evangélico, a despeito de fã de carteirinha de Maria, a mãe terrena de Jesus, não acredito que ela vá me abençoar, pois está com Deus na Sua Glória. Mas e daí? Importa para mim o bom desejo do meu amigo “desejador”.
Quando um amigo espiritualista me deseja “bons fluidos”, ou coisa parecida, não fico zangado. Sei o que ele quer dizer com isso e aceito de bom grado o que há no coração dessa pessoa. Não me incomoda; ao contrário, me dá alegria.
Por outro lado, volta e meia recebo um “what???” ou “o que é isso???” nas redes sociais quando desejo a alguém meus “God Bless”, “Dio vi benedica”, ou “Deus abençoe”. A razão? Sei lá. Talvez a rejeição pura e simples a Deus, por implicância, ou por achar que se desejo bons votos em nome do meu Deus, claramente sou um conservador, e provavelmente fascista, terraplanista, bolsonazista, e por aí vai. Qual o que…
O ano de 2022 promete. Promete coisas más, eu creio, pois quando há eleição num ano, sempre há a maldade da manipulação da nossa sociedade em prol de uma ou outra visão de mundo. 2022 promete trazer coisas boas, também, como é comum. Deus sempre manda nossa quota de sanidade, pela via de coisas boas que Ele tem prazer de lançar sobre a humanidade, apesar de nós. Mas o vidente sempre acerta no “artista famoso que vai partir”, a “enchente que vai inundar o sudeste”, ou mesmo a “guerra que vai estourar no oriente médio… em algum lugar”. Ninguém dá bola. Isso também é praxe.
O que não é praxe neste ano é a culminação de uma cisão social tremenda, desnecessária e que só serve a político e à política. Estamos escravos do nosso sistema político, que concentra poder nas mãos de quem não deveria te-lo, e mantém a renovação política longe da sua plenitude. Mas também será um ano em que esse mesmo Deus, Aquele do “te abençoe”, abençoará de fato esta nossa sagrada terrinha. Poucas vezes tenho visto tanta gente engajada em tentar renovar a política. Gente boa, de fato, se mobilizando para se candidatar e tentar mudar as coisas. Isso vai mexer no cenário, e de fato, só precisamos de uma ligeira maioria no Senado para que a população reconquiste um módico de controle social sobre a política. Para ver o nível de corrupção que inunda as casas legislativas.
Deus vai nos abençoar porque é Deus. Não porque nós merecemos qualquer coisa. Mas essa terra tem sido vítima, por tempo demais, de gente que tem o coração voltado só para seus interesses, e seus grupos de pressão. Ninguém (ou quase ninguém) parece capaz de em determinado momento parar, refletir e pensar “minha posição é ruim para o Brasil”, ou “minha posição tornará gente infeliz”.
Bom, quem é capaz de criar e viver de uma indústria tão perversa como a da seca no nordeste, do tóxico, do tráfico de seres humanos ou de influência no legislativo, é capaz de tudo. Mas para esses também existe um Deus todo-poderoso. E a eles também eu desejo que “Deus os abençoe” – até porque a bênção de Deus assume tantas facetas, que em alguns casos pode significar a frustração de todos os planos de quem meu pedido de bênção é estendido.
Portanto, Deus te abençoe, Bolsonaro (e que você pare de criar encrenca, mesmo com boas intenções). Deus te abençoe Lula (e que você tenha um encontro com Jesus e desista de seus maus caminhos). Deus os abençoe, Ministros do STF (e que vocês passem a julgar com equidade e não com suas agendas políticas). Deus te abençoe, José Dirceu (e que você entenda que Deus existe, e que cobrará de você contas pelas suas maldades contra o país). Deus os abençoe, Macedo, Valdomiro e tantos outros mercadores da fé (e que vocês reconheçam que o que fazem é contrário à Palavra de Deus, em muitos e muitos casos).
Por fim, Deus te abençoe, eu mesmo, e que aprenda a lidar com as dificuldades em mais otimismo e certeza de que há um futuro sempre melhor, não importando a dor do passado; as felicidades do presente, e principalmente da vida Eterna com Deus, são e serão recompensas suficientes por tudo.
Feliz 2022, amigos, Feliz 2022, Brasil, e que Deus nos abençoe, o que quer que isso signifique para cada um de nós!
A primeira menção do termo Guerrilla (Pequena Guerra) aconteceu quando os espanhóis, por volta de 1808, começaram a atacar o exército invasor de Napoleão, durante as chamadas “Guerras Napoleônicas”, enquanto nosso então soberano, Dom João VI, andava comendo coxinhas de frango nas ruas do Rio de Janeiro, acompanhado da mal-educada Carlota Joaquina, outro tipo de guerrilheira espanhola, exportada para a corte portuguesa de então.
Guerrilha passou a ser um termo militar usado para definir pequenos grupos de ataque, ou na definição abaixo:
“Trata-se de levar um adversário, por muito mais forte que seja, a admitir condições frequentemente muito duras, não empregando contra ele senão meios extremamente limitados“
Beaufré, André, in Introdução à Estratégia
Guerrilha contra Nós
Ontem (28/12/2021) escrevi um meio desabafo a que denominei “Rolo Compressor”, ao qual estaríamos sendo submetidos. Uma minoria, com poderes quase que ditatoriais, e que nós, uma maioria conservadora e de vida pacata, não conseguíamos suplantar.
Hoje me ocorreu que não é bem um rolo compressor, mas uma guerrilha, talvez. A observação cautelosa da história dos últimos 150, 200 anos, dá conta de que há uma guerrilha em ação, na qual, de fato, um adversário muito mais forte acaba sendo dominado pela via de ações com meios extremamente limitados, mas efetivos.
Terrorismo
Neste sentido, terrorismo acaba sendo uma espécie de guerra de guerrilhas, pelo uso de força sub-reptícia contra combatentes, e não combatentes, ou seja, contra populações desarmadas, por meios extremamente violentos, cujo objetivo é deixar o adversário de boca aberta, sem reação, baratinado com a capacidade para o mal, empregado contra ele.
O 11 de Setembro, de fato, foi um grande sucesso “militar”, guerrilheiro, se considerarmos o efeito e o custo absurdo em vigilância e segurança. Com o custo a todos nós imposto por essa ação única e ousada, poderíamos ter transformado todo o oriente médio, Irã e Afeganistão, em países de primeiríssimo mundo, com ruas calçadas de prata e calçadas de marfim.
A Guerrilha entre Nós
A guerrilha tradicional, de forma geral, e o terrorismo em particular, têm um defeito de origem: seu potencial de aplicação continuada. Não dá para empregar ataque atrás de ataque impunemente. Depois do 11 de setembro houve o Metrô de Madrid e mais outros episódios de maior ou menor impacto, mas o grande terremoto e comoção gerados pelas Torres Gêmeas não seria repetido com igual eficácia.
Há, porém, a guerrilha no estilo Rolo Compressor, que continua firme e forte, e que nos mantém a todos reféns de várias correntes de pensamento, desde a esquerda internacional, que preconiza a “Pátria Grande” latino-americana, até a dominação cultural de organizações como ONU, OMC e grandes corporações. Esse tipo de guerrilha pode ser usada continuamente, e tem sido usada assim, contra tudo e contra todos os que se opõem ao seus objetivos.
No caso do terror internacional, o objetivo declarado, a Jihad, é uma iniciativa de uns tantos covardes radicalizados, que são incapazes de conquistar corações e mentes pela apologia e discussão ampla, irrestrita, de ideias e ideais. São covardes porque não possuindo meios de convencimento, jogam bombas; inexistindo razão para dar-lhes amparo, recorrem aos aviões pilotados por radicais. Quanto ao terrorismo, sabemos o que ele quer, e de forma mais ou menos precisa, quem são.
No caso da guerrilha intelectual marxista, o “inimigo” é difuso, mas mais capacitado a conquistar incautos pela pregação de suas doutrinas, ainda que igualmente incapazes de debater de forma ampla, aberta, irrestrita, e sem berrar ou recorrer a mentiras. Vemos uma erosão da vida ocidental que ocorre entre os 16 e os 30 e poucos anos, pela adesão a um modo de vida descompromissado com a realidade do emprego e dos boletos para pagar. Após os 30 e poucos, o sujeito começa a acordar para o fato de que não há solidez em qualquer argumento que dê a um estado-deus a primazia sobre a vida de populações inteiras.
De Paulo Francis a Thomas Sowell, de José Guilherme Merchior a Carlos Lacerda, exemplos abundam de gente que, por pensar, simplesmente, deixaram os “tenets” de esquerda, e acabaram virando grandes anti-esquerdistas. Este fato, aliás, da visceralidade com que antigos esquerdistas se voltam contra postulados de esquerda, diz muito sobre o que viram, e como acabaram por entender o que antes acreditavam, e do que se livraram.
Perguntado, Paulo Francis não hesitou em dizer a razão pela qual tinha se desiludido e deixado a esquerda: “Eu cresci“. Amadurecimento gera uma espécie de conservadorismo que nada mais é do que deixar de lado as coisas de menino, nos dizeres do Apóstolo Paulo:
Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, pensava como menino; quando cheguei a ser homem, desisti das coisas próprias de menino.
1a. Epístola de Paulo aos Coríntios 13:11
Há um muro no final da vida de cada um de nós. Quando somos jovens, o muro está tão longe, aparentemente, que não o vemos, e portanto, não nos importamos. A vida, claramente, é infinita. É a beleza da experimentação, da descoberta, das realizações e da ousadia. Não é ruim em si, mas não sei se deve ser estimulado – hormônios já fazem isso bastante bem. Na medida em que envelhecemos, acabamos vendo o muro cada dia mais próximo, e nos damos conta de que mais cedo ou mais tarde vamos dar de cara nele. E começamos a pensar na “Vida após o Muro”. Nos tornamos mais reflexivos e mais cautelosos. Isso também não é ruim em si, mas também não precisa ser estimulado, pois que a falta de hormônios, ou sua substituição por outros, já cumpre o papel.
Mas a guerrilha segue e existe, e certamente não é liderada por menores (em idade cronológica). Se não o é, então quem a lidera? São gente mais próxima do tal Muro do que seus liderados. Deveriam, portanto, ter deixado a sabedoria e seus hormônios, ou a falta deles, falar em seus corações. Deveriam ter-se dado à reflexão e parado de encher o saco de todas as novas gerações.
Então quem são esses guerrilheiros, a dita “Esquerda”? Como cristão, tendo a acreditar que, sabedores ou não, seguem uma cartilha ditava pelo capeta, o capiroto, o coisa-ruim, de destruição de todos os valores implantados com sangue, suor, erros e lágrimas, ao longo de 20 séculos de cristianismo, com auxílio luxuoso do judaísmo (chamar de auxílio é reducionismo, claro). Boa parte sim, cônscios de que são “não-inocentes úteis” nas mãos do inimigo, mas boa parte tão somente não tendo amadurecido a ponto de enxergar que os ideais, à primeira vista tão nobres, de repartição de renda, igualdade, e planejamento central, não funcionam, e nunca funcionarão.
Graças a Deus, como dizia Paulo Francis,
A melhor propaganda anti-comunista é deixar um comunista falar.
Paulo Francis
Deixe-o falar, não o impeça. Ouça até ele parar com a ladainha pré-ordenada, e daí comece a fazer perguntas simples sobre alguns aspectos e peça detalhes sobre como tal e tal coisa funcionarão. O sujeito acabará te convencendo, sem querer, de como o que ele defende não tem base na realidade e como nunca funcionou, e nunca funcionará.
Mas isso não impedirá o rolo compressor de seguir compactando e amassando nossa existência, nem a guerrilha lutando pelas mentes e corações dos nossos jovens.
Estratégia
A estratégia de qualquer guerrilha se resume em poucas ações: escolha de um local em forma de gargalo, surpresa, velocidade, violência e retirada rápida. Foi assim com os espanhóis cortando as linhas de suprimento dos exércitos de Napoleão, e que enfraqueceu estômagos e pernas dos soldados, permitindo o então Visconde de Wellington derrotá-los dentro de Portugal. Foi assim no 11 de setembro, quando uns 10 caras deixaram de joelhos a nação mais poderosa da terra.
É assim hoje, e o local em forma de gargalo são as nossas escolas e universidades, é a nossa mídia, é a nossa cultura. Nas instituições de ensino, guerrilheiros bem treinados atacam de forma pontual os “exércitos” de toda a nação, um pelotão/turma por vez; na mídia, meio dúzia de guerrilheiros bem falantes, dispostos a defender um ideal, atacam de uma posição de vantagem tática (uma câmera e um microfone) milhões de incautos ao mesmo tempo; na cultura, umas poucas centenas de guerrilheiros talentosos e charmosos atacam toda uma população com frases de efeito, palavras bonitas douradas por fora com desejos elevados. E está feita a mágica da guerrilha intelectual moderna. Poucos dominam o cenário mundial, enquanto muitíssimos assistem impotentes, ou tão ocupados em pagar as contas que não têm como fazer nada.
Por fim, não nos esqueçamos de um fator que um ser humano bem formado não costuma lançar mão: a mentira, o engano, a meia-verdade, a violência. Se você é guerrilheiro, não pode ter pudor de atacar a dona do mercadinho, a senhorinha que vende flores no térreo da Torre, ou o pai de família que saiu pra trabalhar e pegou um voo fatídico. Você tem que encarar essas mortes como “danos colaterais”, para um bem maior, e seguir em frente. Minta, engane, falseie estatísticas, escolha com carinho seus entrevistados para falar o que você quer, coloque pílulas de mentira em livros didáticos. Reescreva a história para contar o que você quer; enfim, lance mão de qualquer argumento, mas principalmente, não deixe o outro falar. Sufoque-o com um palavrório sem fim. Tenha um bom fôlego de modo que não deixe o outro argumentar. E se o outro conseguir te pedir detalhes do que você pensa, insista que o tempo acabou e que você precisa chamar os comerciais, ou que a aula está no fim.
Nossa Guerrilha
Temos uma guerrilha para chamar de nossa? Sim, e ela tem milhares de anos: a família. É nela que diariamente os guerrilheiros-pais metem na cabeça dos filhos, dia após dia, coisas “subversivas” como falar a verdade, usar a lógica, não gastar mais do que ganha, respeitar os mais velhos, e por aí vai.
Temos outra tática boa – igrejas. Nelas são completados os ensinos de virtude e frutos do espírito – amor, paz, benignidade, bondade, mansidão, domínio próprio, e coisas contra as quais não havia lei – hoje estão criando.
Uma outra tática, o envelhecimento natural, parece estar ocorrendo sempre, e sobre ela não temos nada a melhorar ou mudar, exceto polir a existência de forma a tornar os anos adicionais de cada cidadão nos mais produtivos de sua vida, e não achar que a vida acabou porque a aposentadoria chegou.
O muro continua lá, o além-muro existe e pode ser uma bênção. Enquanto não batermos no muro, poderemos ajudar outros a pelo menos enxergá-lo. Será nossa maior guerrilha. Sempre.