Perseguição “Científica”

Dei de cara, no site Quillette (que eu gosto muito) com uma história escabrosa de um astrônomo chamado Geoff Marcy, um dos “pais” da descoberta de exoplanetas (planetas fora do nosso sistema solar) que só recentemente (1995 vimos o primeiro) pudemos conhecer, através dos novos telescópios colocados diretamente no espaço e o famoso Keck Observatory em Mauna Kea, no Havaí.

Outros dois astrônomos receberam por essas mesmas descobertas o Prêmio Shaw, astrofísico suíço Michel Mayor e o astrônomo suíço Didier Queloz. Geoff Marcy não recebeu coisa alguma, a despeito de ter descoberto 70 dos 100 primeiros exoplanetas.

A razão foi que houve uma “investigação” no Campus da Universidade da California, Berkeley, sobre “má conduta sexual”. Nada foi nem provado nem ninguém o denunciou. Nada. Apenas que (parece) o cara era gente boa, distribuía abraços e beijos nos estudantes, e trabalhava por uma participação mais ativa de mulheres na pesquisa científica, tendo sido orientador de doutorado de várias mulheres, que depois viram suas carreiras deslancharem.

Alguém pegou a história, e de “leve suspeita” (nem isso parece ser correto) o cara foi pintado como “Agressor Sexual”, e seus artigos foram retirados de publicações de prestígio, não somente pelos editores, mas vetado pelos próprios colegas, que não queriam “se ver associados” com uma criatura dessa estirpe.

O que é Ciência

Não sou acadêmico nem gosto muito da academia, por conta do jeitão de sabe-tudo e o baixo aproveitamento no mundo real, de quase tudo o que se produz ali. Não disputo sua validade e necessidade. Aliás, ao contrário, creio que a academia é vital para o desenvolvimento do conhecimento humano, no mundo todo. Apenas aqui, no Brasil, a academia é uma coisa meio inservível para a economia real e para a vida dos cidadãos.

Richard Feynman, o grande físico e ganhador do Nobel, viveu no Brasil e ensinou na UFRJ por algum tempo. Fascinado pelo Brasil, chegou a aprender a tocar tamborim pra sair em Escolas de Samba. Era um aficionado por nós e nossa cultura. Sobre nossa ciência, mais precisamente sobre a física, ele falou uma frase NADA agradável de se ouvir:

O principal propósito da minha apresentação é provar aos senhores que não se está ensinando ciência alguma no Brasil!”

Richard Feynman, entre 1951 e 1952, em palestra no Brasil

A razão para isso foi que, como dito por ele, os brasileiros sabiam muito “sobre” física, e nada “de física”. Sabiam repetir conceitos e equações, mas não “pensavam” sobre física.

Tendo estudado física, confesso que fiz o mesmo, na mesma UFRJ. Sabia sobre física mas nunca soube de física mesmo. Sabia e sei ainda alguns conceitos, mas me faltava massa cinzenta pra ser um físico. Deixei física de lado e fui me dedicar a algo, digamos, mais dentro das minhas capacidades.

Se em 1951-52 já pouco ensinávamos de ciência, se não faz mais educação formal como antigamente, imaginemos hoje, o que há. Algumas coisas melhoraram, outras pioraram. Uma das razões desse artigo é justamente eu tentar fazer sentido de coisas que a academia faz de errado e que não é ciência. Sabemos hoje que os tais “Wokes” tomaram conta da academia, aqui e no exterior, e como tal, pessoas como Geoff Marcy estão sendo “expelidos” da vida científica mundial sem direito a defesa ou voz. Perdendo “voz científica”, ou seja, o que eles sabem e discutem não tem importância para alguns. O que alegadamente fazem é o que conta (se é verdade ou não, parece pouco importar).

Eu Faço Ciência, mesmo que me comporte Mal?

Não vou nunca achar que erro é algo bom. Erro é erro, pecado é pecado, crime é crime. Pura e simplesmente temos que ter o mais alto padrão moral em qualquer instituição humana – desde a família até a cátedra.

O que não podemos fazer é entender que alguém por ser imoral, por exemplo, é burro ou não sabe fazer ciência. Os avanços de Albert Einstein sobre suas aluninhas eram legendários. Ninguém desculparia Einstein por isso. Ninguém quer jogar a Teoria da Relatividade Restrita no lixo em função das indiscrições do gênio.

“Ah, então se é gênio está desculpado de abuso sexual?” Claro que não. Apenas que a má conduta pessoal não desfaz uma equação tão simples como magistral, como E=MC². Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, como diria Mestre Didi, o da Folha Seca.

E o caso Marcy?

O problema principal com o caso Marcy não é nada remotamente parecido com as escapadas de Einstein. O cara, aparentemente, deixou a Universidade da Califórnia muito triste por ter sido acusado justamente por fazer algo que a sociedade deveria aplaudir: tentar ser sociável e tentar incluir mulheres num mundo ainda altamente masculino, que é o da física superior.

Marcy não fez nada digno de reprovação e foi vítima de cancelamento, ao que tudo indica. Ainda que tivesse sido julgado e condenado, suas descobertas ainda teriam validade científica. O problema (que cansaço!) de hoje é que se joga o bebê fora junto com a água suja do banho, como dizia Joelmir Betting.

Mas mais do que isso, os “sentimentos” e “impressões” pessoais passaram a invadir até uma catedral santíssima, como é a matemática. Não se discute com equação. Não se discute com o Efeito Doppler. Se as conclusões estão corretas, usa-se seu resultado e a ciência vai progredindo, até melhor juízo.

Pois bem, se o Reino da Matemática e da Física foram vilipendiados, o que dizer do Reino da Psicologia, da Sociologia e outras ciências cuja “prova material” e “repetitividade” sob experimentação são, digamos, mais variáveis?

Liberdade Acadêmica

“Como eu me sinto” diante da conclusão de que alguém, sabe-se lá por que razão, não gosta de sua orientação sexual homo afetiva? Se a pessoa não quer, não gosta e não aceita ser levada a acreditar na Teoria da Evolução, mas acha que alguém desenhou a vida na terra? Posso aventar a possibilidade de que as ditosas vacinas causem algum tipo de mal? Posso ser, por isso, execrado do ambiente acadêmico, por ter uma opinião discrepante, mesmo que possa estar errada?

Uma das amarras mais importantes da pesquisa científica reside num “tenet” que é mais ou menos assim: Uma teoria PRECISA ser “Falsificável” (https://en.wikipedia.org/wiki/Falsifiability). Em poucas palavras, qualquer teoria ou hipótese é falsificável (ou refutável) se puder ser contradita, logicamente, por um teste empírico. Se eu fizer um teste que contradiz a teoria, logicamente ela é refutável.

Como é que eu refuto uma teoria, se estou impedido de fazê-lo, por uma razão que não é puramente científica, mas baseada na interpretação de alguém sobre o que é e o que não é “aceitável”? Estou impedido de usar a lógica, a biologia ou a química para provar que a Teoria da Evolução não funciona, já que ela é “aceita” ou “politicamente correta”?

A ciência deixará de fazer perguntas difíceis, porque a resposta passa por descontruir alguma preferência de um grupo?

Fica a pergunta: estamos fazendo ALGUMA ciência neste mundo, de alguns anos para cá, ou simplesmente tentando acomodar resultados às tendências (na minha opinião, muitas vezes diabólicas) de alguns grupos?

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