Legado

Do amigo Mauro, cartunista de Cordeiro – meu muito obrigado!

Estava no centro-norte do Paraná, num evento de um grupo que faço parte há anos, o YPO (Young Presidents` Organization) com mais 7 colegas, todos líderes de suas empresas. O tema mais recorrente era “Legado”. O que eu quero deixar de legado? O que é legado? Qual é o meu legado.

Às 2:00 da manhã do dia 21 toca meu telefone, e Aline, minha esposa, com o cuidado e carinho que ela coloca na voz sempre que algo triste ou trágico tem que ser noticiado informa que meu pai, Prof. Ivanir Figueira Jorge, havia falecido, depois de somente algumas horas no hospital de Cantagalo, Rio de Janeiro.

Eu lá, sem saber o que fazer e a quem recorrer, de carona com os colegas, ligando pros meus irmãos, principalmente Hirann, procurando conter a emoção e tristeza e ser de alguma forma útil.

Obviamente, não voltei a dormir e comecei a pensar justamente no legado que meu pai me deixa. O que meu pai me legou? Financeiramente? Não muito. Intelectualmente? Um montão. Espiritualmente? “Tudo”.

Omnia Recte Fac

O legado do meu pai começou pelo amor infinito que ele sempre demonstrou por nós, desde a mais tenra infância. As ameaças de nos “dar uma tunda”, de “deixar de molho na água de sal”, por conta das peraltices de menino, nunca passavam disso mesmo – ameaças. Ainda ouço: “Estou evitando, Wesley… Estou evitando te bater”… E eu merecia, hein? Nas poucas vezes que ele realmente me deu um “laço”, mereci, em grande estilo. E escapei de outros tantas surras por conta da paciência infinita dele conosco.

O título acima era o “motto” de vida do meu pai, e significa “Faça tudo Corretamente”. Estava num carimbo, que herdei, e que ele carimbava em todos os seus livros.

Interessante, pois este também era o mote de vida de um outro homem que me deixou um imenso legado, meu avô, Armindo Constantino Montechiari. Este, em termos menos doutos, sempre dizia: “Quem faz errado, faz duas vezes”… Cedo aprendi que a toalha seca melhor se estendida no varal, e não em cima da cama (os anos de adolescência nos fazem esquecer essas coisas, até morarmos sozinhos).

Esse “Faça tudo corretamente” me acompanha até hoje, de modo que fico doente de ver um erro cometido por mim, uma idiotice gerada pela minha preguiça (de pensar, de fazer), uma falta de reflexão ou uma resposta rápida demais, sem reflexão. Um pai que até os 14 anos de idade era semi analfabeto, e que capinava (carpia, em curitibês) carreiras de café, morre aos 87 anos dono de boa obra literária, de um currículo imenso (nas palavras de Tia Madalena Tavares) e de tantas realizações acadêmicas e profissionais, que a gente se perde, se quiser listar.

Obsessivo com correção, pediu a meu irmão Hirann, antes de morrer, que queria ser “enterrado de terno, pra chegar diante de Deus com tudo organizado”… bem a cara dele… Por bem organizado, leia-se, bacaninha, limpo, pra enfrentar o Todo-Poderoso tendo feito o melhor. E foi isso mesmo. Ao longo da vida, sempre buscando fazer o melhor. Não fez mais? Não pode, não conseguiu, mas o que fez, tentou fazer o melhor e quase invariavelmente conseguiu.

Legado

Legado foi o tema da discussão entre os amigos, no centro-norte do Paraná, numa fazenda linda, com campos verdes pra todo lado. Engraçado… a definição de legado variava de acordo com muitos fatores, mas o mais importante deles sendo a idade do falante. Quanto mais novo, mais o legado passava pela empresa e realizações; quanto mais velho, mais o legado migrava para o lado familiar e pessoal. Chego no meu legado, e vejo que meu foco foi todo pro lado de um Legado Espiritual. Em suma – como as pessoas que entram em contato comigo veem Cristo, o Cristo que creio e a quem chamo de Salvador.

Naquela madrugada de 21 de Novembro percebi claramente que o legado do velho pai para mim, o maior legado, o mais significativo e o que mais me alegra, foi e é certamente o legado espiritual. Papai me legou o ensino da Palavra de Deus; me legou mais do que isso, a Alegria de conhecer Deus, de amá-lo e viver para Ele.

Meu Legado

Este legado, Espiritual, eu sei que tenho obrigação de passar aos meus filhos, Thomas e Eric, (creio que passei) e eventuais netos que Des me der. Quero deixar esse legado também a quanta gente entrar em contato comigo. Não sei se deixarei que legado financeiro deixarei pros meus, Não sei se deixarei um legado cultural. Não posso, e não me permitirei, não deixar um legado espiritual. Esse foi o maior e melhor legado que o amado Prof. Ivanir me deixou.

Que o meu legado para os meus seja então o que de melhor meu velho pai me deixou – a certeza da Vida Eterna com Deus, uma fé inabalável no futuro, após a morte, um desassombro em relação à vida de modo geral, que tento cultivar com unhas e dentes.

Que o meu legado seja que as pessoas que comigo entram em contato saibam que não tem o que temer de mim, com relação à minha palavra e conduta; que saibam que não precisam esperar de mim nada “menor”.

O amor aos livros, como disse meu irmão Jason, no funeral do pai, foi um legado importante – para todos nós. Esse foi apenas um legado, oriundo desse caráter lindo, desse pai amoroso, desse amigo fiel, dessa pessoa que a tantos apoiou, ajudou, nutriu, educou, e com quem me encontrarei em breve.

Que o meu Legado seja o mesmo que o meu pai sempre deixou – Vida, Verdade e Paz para quem conviva comigo.

O Pai já está em Paz com o Pai dele. Eu estou em Paz com o Pai, aqui, com saudades, doído, mas em Paz!

7 comentários em “Legado”

  1. Sincero, lindo, emocionante! Quem conhece você amigo certamente vê reflexos do pai que você descreveu. Que bela história. Homens como ele deixam legado no coração e na mente de quem tem a sorte de conviver, interagir ou simplesmente cruzar o seu caminho. Abraço e força. Everton

    1. Meu pai era um cara muito bacana. Foi um bom pai, e enquanto teve lucidez, uma beleza de se bater papo. Sabe amigo? Pois é… soube ser. Obrigado pelos seus comentários, brother!

  2. Lindo, emocionante, inspirador, confortante, “refrescante” esse “legado” (texto).
    Que o Senhor te permita deixar esse legado (espiritual entre outros), para tantos quantos for possível.
    Um grande beijo no seu coração, meu nobre irmão (primo) Wesley.

  3. Meu querido amigo

    Extraordinário o legado que você, felizmente, pode discernir desde bem cedo.
    Há quem passe quase uma vida inteira tateando, ofuscando a verdade que está ante seus próprios olhos.
    De certa forma, ainda me incluo nesta “rela”.
    Contudo, pouco a pouco, começo a ver A intensa Luz na escuridão.
    Fui muito pobre de espírito por não ter olhado pela ótica apropriada o Legado explícito que meus pais e irmãs martelavam em todos os momentos que juntos estávamos.
    Orgulho? Soberba? Burrice simplesmente?
    Só Ele pode me julgar…
    Mas, eu me condeno.
    Contudo, ainda tenho algum tempo. Tempo este que
    Ele, na Sua infinita misericórdia, reservou para que eu percebesse o Seu Precioso Legado.
    Deus é fiel. Ele é Poderoso. Ele é misericordioso.
    Basta fecharmos os olhos e pedir que nos FALE!

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