O taxista baiano

www.unsplash.com

Numa dessas minhas andanças recentes a trabalho pelo país me deparei com um cidadão extremamente bem falante, educadíssimo, boa cultura, voz mansa, dirigindo um taxi que me levaria de um lado a outro da cidade de Feira de Santana, na Bahia.

Ah… a Bahia… um local único onde a cidadania enxerga o mundo de uma maneira muito interessante, nem sempre correspondendo ao que se vê no dia a dia. Bahia de todos os santos, e demônios também… Mas deixemos o coisa-ruim pra lá, se der pra fazer isso.

Arthur Schopenhauer, em seu livro “Como vencer uma debate sem ter razão alguma” elenca 38 formas de debater, e ser bem sucedido, sem ter razão. É, obviamente, uma fina ironia mas define exatamente o mundo em que vivemos, sem a obviedade: quem assim debate não sabe que não tem razão, muitas vezes.

Foi o caso do dito chofer de praça… Lá pelas tantas, numa dessas interjeições que me marcam (e me atrapalham) lanço uma expressão sem objetivo claro, algo do tipo “isso é coisa de esquerdista”, ou “gripezinha, como a Covid”. Foi o suficiente para, com voz calma, branda e didática, eu ter sido ensinado, entre outras coisas: a)meu negacionismo, com relação à Covid; b)meu erro por achar o Paulo Guedes um bom ministro da economia; c)minha suprema burrice por não enxergar o que claramente se nota – que o preço da gasolina está alto por culpa única e exclusiva dos nossos dirigentes.

Não se iludam os meus (parcos) leitores. Nada foi dito com raiva. Não fui chamado de fascista, negacionista, terraplanista e tudo o mais. A voz branda me “educou” em vários aspectos da minha vida em que eu, obviamente, estou totalmente errado. Num dos momentos áureos da corrida que não durou 20 minutos, foi educado no que significam dados científicos. “Vou lhe dar dados à prova de bala: a Covid mata mais do que qualquer outro vírus – as estatísticas (sei lá de que, nem me lembro) confirmar. É ciência!”. Admiti, claro, que matava, pois é verdade. Mas dizer que mata, e mata mesmo, mas que não seria razão para declaração de pandemia ou “feche tudo” não serviu de nada. Os olhos diziam da tristeza que ele sentia por mim, uma alma condenada ao purgatório, no mínimo.

O senhor tem que entender que o Paulo Guedes está fazendo uma péssima gestão. Não vê a inflação? Não vê o preço da gasolina? Não vê como a gente está morrendo de fome feito moscas nas ruas?“. No que eu tento (em vão) contra argumentar – mas o que foi possível foi feito, creio, um auxilio de R$ 400,00 para quem não tinha nada é o que se pode fazer num país com orçamento apertado.”… “Seu Wesley, vou lhe ensinar uma coisa – nós somos um país de miseráveis, e R$ 400,00 são esmola…“. Tá ok… fazer o que, ele tem razão, a economia, afinal de contas, a gente vê depois.

Minha irritação sobe na medida em que a vozinha de padre de paróquia vai ficando tanto mais agressiva nos argumentos quanto mais doce e branda no tom. Eu ia perdendo a paciência. A discussão, eu já tinha perdido. No final da corrida o meu professor de economia e saúde ainda me diz “o senhor entendeu“? Eu, obviamente já com cara vermelha digo: “meu amigo, você deveria parar e pensar no que fala, porque dissemina um nível de falsidade que não dá pra tolerar“.

Ponto pro taxista. Bola fora pra mim… vou aprender um dia a ter vozinha de padre, a não perder a calma quando confrontado com argumentos tão “acachapantes” como esses… e depois, de saideira, tive que dar a minha nas costelas dele, às expensas do bondoso e amigo povo baiano, que nada tem a ver com essa situação em particular: “você deve ter razão… afinal, a Bahia há anos vive sob governos tão bons, e tem taxa de desemprego e IDH tao altos”…

Que baixeza da minha parte… não sabendo como “me defender”, aplico um golpe baixo desses… Um dia eu aprendo…

Um comentário em “O taxista baiano”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *