Selic acima de qualquer retorno possível – a Saga da Inflação

A recente elevação da Taxa Selic, pelo Banco Central, para 14,25% acena para dois fatores. Um, surpreendentemente bom, e outro que remete a um cheiro de naftalina que eu julgava que estava num passado definitivamente morto e enterrado.

É positivo

O novo presidente do Bacen, contra minhas piores dúvidas, se revelou mais técnico do que político, e elevou a taxa Selic, num reconhecimento de que o aquecimento (artificial) da economia brasileira aponta para mais inflação, o que leva à necessidade de juros altos para desaquecer os ânimos.

É positivo, num contexto extremamente negativo, em que a economia cresce por uma demanda turbinada a gastos públicos descontrolados e “bolsas”.

Mais recentemente, o tão necessário aumento no limite de isenção do IR para o cidadão que ganha até R$ 5.000 vem no pior momento possível, e sendo contrabalanceado com uma medida que certamente desagradará a todo mundo (eu incluso) e que certamente terá efeitos colaterais que este governo não sabe precisar: evasão, por um lado e “criatividade” por outro.

É negativo

É negativo, é claro, porque juros nas alturas, ainda mais pelas razões que temos diante de nós, só pode ser considerado uma insanidade. A razão, obviamente, está fundamentada e explicada pelo aumento vertiginoso de gastos públicos, descontrole sobre estatais e burrices sobre burrices de condução da máquina pública que atende pelo nome de populismo social. Um populismo diferente do anterior, que denomino populismo “de gogó”. É negativo, ainda, pela qualidade dos gastos públicos. Tira-se gasto de áreas produtivas ou indutoras de produtividade, como Embrapa e outras, e coloca-se em ações para agradar “movimentos sociais”, cujos resultados são pra lá de incertos, se é que desejáveis.

É negativo porque é uma corrida contra o tempo para tentar não estourar o orçamento. Mais ou menos uma família que contrata despesas no cartão de crédito e depois sai atrás de aumentos de salário. Improvável, e de consequências possivelmente funestas.

Preço dos Ativos

Por volta da virada do milênio, a jornalista de economia e amiga, Mirian Gasparin, me perguntou em entrevista por que a Sanepar (à época planejava-se privatizar) tinha um valor de mercado tão baixo (francamente, nem lembro quanto era). A resposta que dei se baseou justamente na Selic da época: 45%, máxima histórica, durante os anos FHC. Que retorno sobre investimento resiste a uma comparação com uma Selic dessas?

O valor dos ativos deve ser sempre comparado com um “custo de oportunidade”. A oposição da época (o governo de hoje) estrilou barbaridade contra a privatização como “espoliação do povo brasileiro”. A Sanepar não foi privatizada, na minha visão corretamente, à época. Não porque privatização seja coisa ruim – eu acho que governo tem que cuidar de de saúde, educação, segurança pública e defesa, mas porque, como qualquer bom gestor, espera-se o melhor momento, a melhor janela, o melhor preço, para vender um ativo.

O termo “WACC” ou “CMPC” (Custo Médio Ponderado de Capital, em Português) refere-se à média do custo de capital próprio e de terceiros. Ora, se o custo do capital de terceiro ancorava-se em uma taxa básica de 45% em 1999, hoje ancora-se em não menos absurdos 14,25%. Isso, obviamente, deve ser comparado com a inflação da época: 20,12% (total de 1999) contra algo entre 5 e 6% esperados para 2025.

O tempo passa, o tempo voa, e a tal da irresponsabilidade fiscal continua numa boa… Créditos a FHC, pelo menos nesse caso, convivendo com uma economia que, claro, que vinha de uma hiperinflação, somente 4 anos antes, e tentava domesticar expectativas de que o Real fosse sucumbir, como sucumbiram o cruzado, cruzeiro, cruzeiro real, etc.

O site www.infomoney.com.br de hoje pergunta – que ativos ainda rendem acima da Selic de 14,25%? Poucos Quase nenhum. E não é por falta de eficiência ou trabalho, mas por excesso de taxa.

Os valuations certamente demonstram decréscimos cada vez que o custo de oportunidade aumenta (Selic aqui, juros nos EUA, Europa, etc, lá fora) que vai fazer com que a competitividade do preço dos ativos listados em bolsa (e fora dela, por decorrência) vire pó.

Conclusão

A conclusão não poderia ser menos animadora: falamos de um governo que vai na contramão da história econômica recente, não somente aqui, mas em diversos países. Mais do que isso, não o faz por desconhecer a doutrina econômica que funciona, mas por desejo evidente de contrariá-la, já que em o fazendo obtém o resultado desejado: uma população crescentemente dependente de bolsas; os que não fogem do país, claro.

Ontem, um amigo/sócio nosso de origem coreana deu o tom da história: eram 30 mil coreanos no Brasil até a pandemia. De lá pra cá, 20 mil saíram do país pra tentar a sorte em outros lados. Industriosos e inteligentes, os coreanos, com recursos suficientes para migrar, vazaram e nos deixaram pelos motivos óbvios: apontamos na direção errada, em relação ao resto do mundo.

O êxodo será proporcional ao descalabro. Deus nos acuda!

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