As viagens missionárias do fazedor de tendas mais famoso da história…
Este pequeno artigo será, se Deus quiser, expandido para algo mais substancial sobre o modelo de futuro que creio que seja adequado para o movimento Business as Mission, BAM, ou na melhor tradução possível, “Missão Empresarial”, ou “Negócios como Missão”. Autores consagrados, como Mike Baer, Mats Tunehag e João Mordomo, entre vários outros teóricos de BAM, juntos conosco no 1º. Encontro do BAM Brasil, entre os dias 18 e 19 de Maio de 2024, nos brindaram com palestras fantásticas que versaram sobre a forma como nós, empresários, podemos e temos obrigação de olhar para nossas empresas e firmas com um olhar “sagrado”.
A principal mensagem, o principal “produto” que levei para casa deste congresso foi:
“Não há hierarquia entre o homem de Deus pastor, pregador ou missionário, e o homem de Deus empresário ou profissional liberal”.
Congresso BAM Brasil
A tendência que temos de olhar para os “clérigos” como gente mais próxima a Deus é absolutamente equivocada, e fruto de um mundo que começou a tratar coisas sagradas e profanas separadamente, relegando os negócios ao plano inferior. As razões são várias, e não vamos entrar nelas de cabeça, mas apenas resumindo, somos considerados mais profanos porque:
- A cosmovisão católica que permeia boa parte do mundo hierarquizou e segregou o clero dos fiéis, sendo os empresários relegados à segunda categoria.
- A visão de que lucro é pecado faz com que entendamos que o que fazemos é “arrancar algo de outra pessoa”. É uma visão deturpada da economia e das pessoas de forma geral. Estamos sempre ocupados em sublinhar o que de pior vemos nos outros.
- A visão especificamente brasileira, em que um certo empresariado está sempre mancomunado com os governos, para obter vantagens indevidas, e mais, a visão de sonegação como um “mal necessário” à sobrevivência das empresas nos faz achar que empresário é alguém que vive num ambiente menos santo.
A despeito de tudo isso, o movimento BAM tem avançado no Brasil e no mundo, fomentando uma nova geração de empreendedores focados em gerar riqueza, para si e para os stakeholders de seu negócio, de forma saudável, socialmente e ambientalmente responsável, mas, sobretudo, espiritualmente comprometidos em viver (mais do que falar) o Evangelho dentro de nossas organizações.
Nós mesmos dentro da VBR Brasil temos tido a oportunidade de ter um turnover bastante baixo nos nossos funcionários. Parte disso, eu creio, advém de um ambiente social e espiritualmente saudável, onde a competição não é estimulada, se leva outro a ser deixado de lado. A competição é estimulada no sentido do melhor esporte do mundo – o golfe – no qual a pessoa, no fundo, joga contra ela mesma, suas limitações e momentos. Um ambiente espiritualmente saudável parece ser conducente a um relacionamento saudável entre as pessoas. As gerações mais modernas parecem gostar disso mais do que de um salário um pouco maior.
BAM joga, então, com a formação de empresas que tenha o poder de impactar o mundo, a começar por seu ambiente de negócios mais próximo, para Cristo e o Seu Reino.
A questão aqui não é mudar nem criticar esta filosofia do trabalho BAM. Ela está perfeitamente em linha com o Novo Testamento e com a Grande Comissão. Ela deve continuar a ser estimulada. Empresas cuja propriedade seja de servos de Deus devem ser estimuladas a se tornarem empresas BAM, sérias com Deus e Seu propósito. Ele continua a querer receber Glória (Doxa, como adora dizer João Mordomo) entre as nações.
O que quero tratar aqui é do futuro de BAM, como forma de penetração nessas nações. O objetivo aqui é tratar do Fluxo de Capital intergeracional, e como isso pode afetar BAM e a atividade e missionária mundial. Temos algumas certezas sobre o mundo atual – social e econômico:
- Ele jaz no maligno (1 João 5:19).
- Ele exerce crescente perseguição sobre o povo de Deus (Ap. 2:10)
- Ele tornará o livre acesso das pessoas ao Evangelho cada vez mais difícil (Rom 8:36).
Diante disso, chegará, em breve, o tempo em que a existência de missionários será restrita de tal forma que somente não-clérigos poderão estar no meio de determinadas populações. Quem serão esses? Nós hoje os chamamos de bi vocacionados, de fazedores de tendas e muitas outras formas. O fato é que o mais bem sucedido “não-clérigo” me parece ser aquele que tem interesses vestidos em empresas e países em regiões complexas, ou que, pela natureza de suas empresas, possuam alcance grande o suficiente para serem relevantes em um local remoto, a despeito de estar ou não lá (a internet pode ser bênção, com certeza).
Do OPEX ao CAPEX
Como me pronunciei durante o painel-entrevista entre mim, e a Lara, brilhante guria de 22 anos, já CEO de sua empresa BAM, e antenada na vida espiritual e empresarial (uma alegria de ver!) e o querido Danilo Brizola, BAMer e agitador profissional, acredito em uma mudança na forma de alocação de recursos para missões.
Estratégias Atuais – a primeira onda – o OPEX[1]
A principal estratégia missionária mundial atual data dos primórdios da BMS – British Missionary Society, criada pelo querido e famoso William Carey no Séc. XVIII ainda, e cujo sucesso é inegável. De lá para cá tem sido mais do mesmo: reunião de fundos via denominações e pessoas empenhadas em contribuir para o Reino. Esses fundos são então lançados sob forma de cobertura de subsistência de missionários profissionais (a palavra é inadequada, mas é uma que reflete o que de fato existe), e os resultados são de maior ou menor intensidade, a depender do local, do estilo de trabalho e outros fatores, muitas vezes incontroláveis.
Essa foi a estratégia vencedora, por exemplo, no Brasil. Mesmo em sendo um país nominalmente cristão, o estilo de cristianismo havido aqui sempre foi mais não-praticante, ou não “nascido de novo” (embora não possamos negar o caráter eminentemente cristão de muitas e muitas lideranças religiosas do país ao longo dos séculos). As denominações evangélicas do velho mundo e dos EUA, primariamente, identificaram o Brasil como uma potencial fonte de cristãos nascidos de novo, e despejaram recursos humanos e materiais aqui.
Eu mesmo sou fruto disso, pois minha família, originalmente italiana e católica, passou por um processo de profunda transformação, a ponto de sermos hoje identificados diretamente com o cristianismo evangélico já por 4 gerações.
Essa foi a onda do OPEX, que ainda é a mais usada por organizações missionárias e denominações.
Estratégias Atuais – a segunda onda – o CAPEX[2]
Em um ambiente de repressão e dificuldades, apenas a lógica econômica mais direta e atraente para o país receptor vai permitir que o jogo continue a ser jogado. É muito mais difícil recusar um visto a um CEO de uma empresa investidora estrangeira do que a um missionário, ou, como tem acontecido frequentemente, missionários travestidos de estudantes de idiomas ou outras funções.
A motivação econômica direta é ao mesmo tempo legítima e legitimadora dos cristãos que, independentemente de qualquer coisa, vão ganhar a vida em outro país, pelo meio do empreendedorismo e do trabalho árduo e honesto.
Para isso, antevejo a necessidade de uma mudança em direção ao modelo seguinte. Aqui, uma pausa para segregar um conceito já apelidado de Business FOR Mission (Negócios PARA Missão) e o que proponho agora. O “disclaimer” de BAM diferencia o conceito de BFM de forma inequívoca[3]
“Business as mission é diferente de… BUSINESS FOR MISSIONS
Lucros de negócios podem ser doados para dar suporte a missões e ministérios. Isso é diferente de BAM. Alguém pode chamar isso de negócios PARA missões, ao usar negócios para prover fundos para outros tipos de ministérios. Reconhecemos que lucros de negócios podem dar suporte a “missões”, e que isso é bom e válido. De forma semelhante, empregados podem doar parte de seus salários para causas caritativas. Enquanto tal possa ser encorajado, nenhum de nós gostaria de ser operado por um cirurgião cuja única ambição seja a de fazer dinheiro para ofertar à igreja. Ao invés disso, esperamos que ele tenha as habilidades corretas e que possa operar com excelência, fazendo seu trabalho com total integridade profissional. De forma parecida, um negócio BAM deverá produzir mais do que produtos ou serviços a fim de gerar riqueza. Ele deve buscar cumprir os propósitos e valores do Reino de Deus através de cada aspecto de suas operações. O conceito de negócio BFM pode limitar os empresários a um papel de doadores aos “ministérios reais”. A despeito da doação ser uma função importante, BAM se trata de negócios com fins de lucro, mas focados no Reino.[4]
Entendi, então, que o que temos em mão se trata de algo diferente, cujo nome provisório (e conceito por trás dele) poderia ser “BUSINESS ON MISSION”, ou “BUSINESS ON MISSION BASE” (Bomb).
Trata-se aqui de uma forma de empreendimento imaginada, planejada, gestada e capitalizada para uma função legítima (gerar lucro, como BAM) e ao mesmo tempo, servir de veículo também legítimo para que cristãos possam espalhar a Boa Nova a povos não necessariamente alcançados, ou totalmente não alcançados.
Não falo aqui de enfiar evangelho goela abaixo de nenhum povo ou “colonizar” o outro, mas tão simplesmente viver a sua fé simples e forte, permitindo que outros “vejam a Cristo” em nós, ainda que sem qualquer proselitismo. É proibido fazer proselitismo? Não façamos, mas NÃO deixemos de viver a Palavra e exalar “o bom perfume de Cristo”.
Como?
A forma mais objetiva de BOM, ou BOMB (!!!) se baseia em transformar esse atual OPEX (ofertas para missões) em CAPEX (investimentos em missões). Dentro desse conceito, a que eu acho mais atraente e que pode dar os melhores resultados é a acumulação de capital no sentido de gerar Fundos ou Entidades de Investimento legítimos, cujo objetivo é o lucro, mas cuja estrutura operacional crie oportunidade para que cristãos “raiz” se disponham a trabalhar como executivos em locais normalmente complexos, de forma legítima, mas com olho e tempo para a propagação do Reino, nesses locais.
Não advogo de nenhuma forma que levemos equipes inteiras para essas empresas e atividades. Ao contrário, a contratação de pessoal de base local é fundamental. Ajuda a criação de emprego no país destino, reforça a economia local, recolhe tributos de forma legal e correta, e, no fim das contas, permite que interajamos com os cidadãos locais, levando-os, sem colonialismo, mas com amor profundo, ao conhecimento de Cristo.
Esses fundos funcionariam mais ou menos assim[5]:
Transformar as “doações” em capitalizações para Fundos de Investimento (Private Equities, entre outras plataformas) com todas as salvaguardas, garantias e governanças das leis dos melhores países e jurisdições para tal.
- Estabelecer para o Fundo: a)As regras de investimento As regras de assunção de riscos e retornos; b)As regras de reembolso e reinvestimento; c) As regras de segregação de retorno ao Fundo e à transformação de CAPEX (retorno) em OPEX (novos bi vocacionados e líderes de campo); d)Um Board com visão alinhada com BAM e com o Reino.
Desta forma, bons investimentos vão gerar bons retornos, que terão três virtudes:
- Tornar o movimento autossustentável
- Tornar o movimento menos vulnerável a governos e políticas religiosas de países.
- Dar ao movimento condições de crescimento mais acelerado do que a mera arrecadação de doações, ofertas e compromissos.
- Tornar a vida dos bi vocacionados, na ponta extrema do movimento, mais estável.
Política de Emprego e Liderança
Empresas BOMB, ao serem comandadas e coordenadas por uma liderança BAM, teriam necessariamente, como já disse, que empregar localmente o máximo de pessoas, mas manter a liderança ligada e alinhada diretamente ao Fundo, a BAM e aos princípios BOMB.
Isso implica e que, em algum momento, empregados locais convertidos e comprovadamente capazes, passarão a ocupar cargos de liderança, alinhados com os princípios do movimento. Obviamente que lideranças cristãs locais e capazes podem ser recrutadas de imediato, o que normalmente não parece ser tão fácil.
Em qualquer circunstância, é ser “sal e luz” que vai ganhar o jogo, e não fazer proselitismo ou impor um modo de pensar.
São apenas reflexões não teóricas, baseadas em conceitos mais “heróicos” do que acadêmicos, mas podem servir de reflexão aos pensadores do Movimento como um todo.
“Não por força, nem por violência, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor”
[1] Operational expenses, em inglês, ou “Despesas Operacionais”.
[2] “Capital Expenditures”, em inglês, ou Gastos de Capital.
[3] Aqui, o puxão de orelhas de João Mordomo me ajudou no avanço para o conceito que apresentarei a seguir.
[4] Extraído do manifesto de BAM, traduzido por mim.
[5] O Fundo IBEX, que eu mesmo invisto, trabalha quase exatamente neste modelo.