Da República Romana a El Salvador

Um livro comprido, meio chato, mas de fundo histórico inegável (“Patrician of Rome”) li sobre o cerco de Roma pelos bárbaros Volsci, ainda no nascedouro da República Romana, por volta de 384 aC. e a sua defesa heróica pelo patrício (nobre) Senador Marcus Manlius “Capitolinus”. O nome “Capitolinus” foi, inclusive, uma honraria garantida pelo Senado romano ao defensor justamente do Monte Capitolino, onde ficavam os órgãos do governo da Roma republicana, a Curia (Senado), os templos, as cortes de justiça etc.

Menos de 4 anos depois, esse mesmo Senador Manlius Capitolinus era lançado de cima da Rocha Tarpeia, local de execução reservado aos criminosos mais terríveis, e traidores da pátria. A razão era simples: considerado o primeiro “populista” por Suetônio, o historiador romano da antiguidade, Capitolinus havia se aliado à “plebe” na restituição de seus direitos básicos, retirados durante os duros anos pós destruição de Roma pelos Volsci. A plebe havia se endividado junto aos usurários da cidade e seus senadores mais ricos, e haviam sido ajudados por Capitolinus a sair das dívidas, com a venda, inclusive de seu patrimônio pessoal.

Os moradores dos “Mons” (montes ou colinas romanas) eram os patrícios. A plebe morava na planície entre os montes. Quem visita Roma conhece bem essa geografia linda. Os patrícios (não todos, uma minoria, na verdade) eram muito ciosos de seus “direitos” sobre a plebe, e a extorquia, pela via da usura, dos altos preços do trigo e outros alimentos. Um par de Consules (sempre eram dois, eleitos a cada ano) passavam legislações que lhes beneficiava muito. Se uniram a gangues de regiões mais obscuras da cidade, como a Subura (que voltou às telas recentemente numa série de TV), e deixavam que essas aterrorizassem a população, exceto os ativos e negócios dos senadores. A cobrança de tributos passou a ser de tal forma desigual, que, somada à insegurança e à falta de incentivo para trabalhar e empreender, gerou uma revolta da plebe.

Olhando de fora, parece algo bem similar ao que ocorre hoje em vários países do mundo. Elites “senatoriais” se unem a bandos armados de foras-da-lei, deixando-os aterrorizar uma população desarmada (sim, era proibido portar armas na Roma antiga). O resultado foi um “El Salvador” da antiguidade – acabaram por eleger um “Ditador” (por ironia, via Senado). O velho general e senador Marcus Camilus, chamado “o segundo fundador de Roma”, pela derrota pós invasão dos Volsci pelas legiões sob seu comando. O general acabou por resolver dois problemas – acabou com a revolta da plebe, que de fato nunca aconteceu exceto verbalmente (como certos eventos recentes no Brasil) e acalmou os ânimos do Senado, colocando lá nomes melhores. A história, bastante difícil de precisar, devido à falta de dados históricos de qualidade, dá aos dois nomes posições de destaque. Os senadores opressores, de nomes Lucius Valerius Potitus Poplicola e Marcus Furius Camillus, passaram à história como o lado negro da força.

Em tempos de crise, tanto na Roma antiga como na Grécia Clássica, tempos difíceis ensejavam a escolha de um “Ditador” para conduzir o país sem ter que prestar contas a milhares de burocratas. Era um imperativo do momento de crise. Como bem definido por Maslow, e hoje, claramente, descrito pelo articulista Luciano Trigo no seu texto O exemplo de El Salvador (https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/luciano-trigo/o-exemplo-de-el-salvador/), o povo salvadorenho fez uma opção daquelas que não há justificativa moral para recriminar: entre viver e morrer, é preferível viver, afastando momentaneamente todas as considerações de caráter menos imediatas, como comer, obter auto-realização, entre outras. El Salvador acaba de retomar essa mesma atitude, reelegendo o estranho Bukele com 85% dos votos, para raiva e desespero de uma mídia que, não se entende bem por que, exalta mais a criminalidade do que seu combate.

As semelhanças dos dois locais, separados por 2,5 mil anos de história e uns 10 mil Km de distância são marcantes. Bukele é, para todos os efeitos, um ditador, escolhido por uma população amedrontada, para por fim a um reinado de terror imposto pelo narcotráfico desde 1987. Pode-se não gostar, mas é bastante revelador do momento que vários países da América Latina vivem. Pergunte a qualquer carioca de classe média ou média baixa, ou mesmo muitos de classe média alta ou alta, se não concordariam com mais segurança, mesmo que isso significasse mais presídios e mais condenações, menos saidinhas de fim de ano e outras benesses, e verão que a lógica é a mesma.

Bukele encarna um ditador que traz soluções aos males imediatos. E com a queda do número de homicídios de 100 para 7, por cada cem mil habitantes, é reveladora do nível de eficiência alcançado. Bukele chama alguns governantes da região de “amigos de bandidos”, e tem razão. Temos amigos de bandidos em muitos locais. Os senadores romanos eram amigos de bandidos, já em 384 a.C. Poderosos sempre tenderão a se aliar a bandidos, se isso os beneficiar. Para alguns tipos de pessoas, aparentemente não há nunca dinheiro suficiente, ou poder suficiente. Mais é sempre mais, e sempre justificará quase qualquer atitude, por mais errada que seja.

Tivemos nosso momento “ditatorial” segundo alguns, na pessoa do ex-presidente Bolsonaro. Não me parece que foi minimente hábil como para se reeleger. Cometeu quase todos os erros da cartilha política, e cedeu, em momentos cruciais, ao establishment, como aliás, fez Macri, ex-presidente da Argentina, o qual, igualmente, pagou com a derrota na tentativa de se reeleger.

De ditador, pouco tinha. Mas assim ficou marcado pela narrativa que ora atribui a ele até mesmo o desastre de Chernobil, ou a Covid-19. Esperamos o nosso “ditador”? Eu preferiria que o bom senso e o equilíbrio entre poderes seja retomado no país, e que independentemente de ideologias, a paz e a segurança sejam restabelecidas, assim como uma justiça minimamente sã. Difícil acreditar nisso a curto prazo.

Vivamos com a esperança de que um ditador não seja necessário, e que momentos que levam a uma ditadura não sejam vividos. São coisas tristes demais para serem sequer cogitadas, mas às vezes inescapáveis.

Proibir Criptos?

Duas opiniões divergentes, uma de um “banqueirão” mundial, outra do presidente do nosso Banco Central, vão em posições diametralmente opostas.

Em sabatina no Senado dos EUA, o CEO do J. P. Morgan, Jamie Dimon, disse que “se ele fosse o governo, acabaria com as criptomoedas (https://www.infomoney.com.br/onde-investir/se-eu-fosse-o-governo-acabaria-com-as-criptomoedas-diz-ceo-do-jpmorgan/).

Já Roberto Campos Neto vai na direção contrária, e diz que “Acho que melhor do que expelir e tentar proibir é tentar entender e trazer para perto do mundo financeiro” (https://www.infomoney.com.br/onde-investir/proibir-criptomoedas-no-mercado-financeiro-nao-e-a-melhor-solucao-diz-campos-neto/).

Quem tem razão? Ou melhor, que objetivos têm cada um desses caras? Algumas coisas vêm à mente. Tudo tem prós e contras, e vou listar os meus, porque francamente fico dividido por conta de diversas particularidades desses ativos, suas maravilhas e seu potencial incrível para oprimir o cidadão.

Reserva de Valor

Criptomoedas são uma espécie de “metal precioso” intangível. Ouro, platina, prata (em menor extensão) sempre foram considerados reserva de valor, ainda que não tenham, nem de longe, a aplicabilidade prática do ferro/aço, alumínio ou cobre. São reserva de valor por duas razões: raridade e durabilidade.

Neste sentido, as Criptos cumprem este papel. São relativamente raras (sua mineração é complexa, implica provar as chamadas “Provas de Trabalho” (PoW ou Proof of Work), e, como na mineração comum, se alguém “acha” o “metal”, se beneficia dele. É a recriação da corrida do ouro em escala digital. Além disso, a tecnologia blockchain faz delas algo relativamente “blindado”. Melhor do que o ouro, que pode ser roubado, o sistema descentralizado e quase à prova de bala do Blockchain faz com que esse “ouro digital” seja seu próprio Fort Knox.

Uso em Trocas

Os Maias, na América Central, possuíam um montão de ouro, mas nem por isso fizeram dele uma “moeda” ou meio de trocas. Assim, eram pouco mais do que uma coisa bonita pra adornar o pescoço, de valor menor do que muitos outros bens cambiáveis. Os espanhóis entraram e pegaram o ouro, o que não me consta ter sido agressivamente contestado pelos mesoamericanos. O pau quebrou lá por outras razões, como terras e poder. Não pelo ouro.

Os espanhóis tinham para o ouro uma função. Os criptoativos foram criados de olho justamente nesta função – de ter um ativo usado em trocas comerciais com segurança, durabilidade e valor.

Abuso em Trocas

Como tudo o que é raro e caro no mundo, não custou para que sofisticados esquemas fossem criados para fazer com que os incautos comprassem sonhos lastreados em Criptomoedas, apenas para ver sua grana evaporar na mão dos “Ponzi Schemers” do mundo.

Ora, os esquemas Ponzi, ou pirâmides, já existiam antes da existência mesma de computadores. Assim, a afirmação do CEO do J.P. Morgan, de que os tais esquemas são razão suficiente para atacar a existência mesma desses ativos me parece lúdica, pra dizer o mínimo.

Porto Seguro para Crimonosos

A deputada democrata, Elizabeth Warren, fala com certa propriedade que “Os terroristas de hoje têm uma nova maneira de contornar a Lei de Sigilo Bancário: criptomoedas”. Nós podemos ter uma noção relativamente realista de que traficantes de tóxico de armas e políticos corruptos do mundo inteiro devem fazer uso desse meio para ocultar seu patrimônio e deixá-lo inalcançável às autoridades.

Obviamente que bandido não precisa de incentivo para “contornar sigilo bancário”. Bandido faz até submarino pra traficar tóxico, corrompe com toneladas de dinheiro alguns governos, tornando-os passíveis de diálogos cabulosos e amistosos. Bandido é bandido, qualquer seja a posição que ocupe.

Assim, não podemos ter ilusão de que: a)a inexistência das criptos implique em resolver o problema da ocultação de bens; b)a proibição de criptoativos vá acabar com os mesmos, nem com sua utilidade ou uso. Tornar a platina ilegal, e só o ouro legal, mal comparando, não vai fazer com que o bandido jogue seu estoque de platina fora.

Medo Verdadeiro

Como conclusão, aí vai meu verdadeiro medo: o controle seletivo de cidadãos e suas atividades pelo uso de Criptomoedas E MOEDAS FIDUCIÁRIAS DIGITAIS, como é o caso do DREX, recém lançado pelo Banco Central. No fundo, tenho menos medo das Criptomoedas do que das Moedas Digitais como o DREX.

Corremos o risco de ver, num futuro próximo, alguns cidadãos, como dissidentes de alguns países não-democráticos, ou mesmo em pseudo-democracias, serem limitados em seus direitos por conta do fato de que cada “DREX” em sua carteira é de conhecimento dos donos do poder, e suas atividades sejam rigorosamente vigiadas e coibidas, sem autorização judicial. Ou melhor, sem autorização de um judiciário decente e democrático, ciente de seu papel numa democracia.

Meu medo, como Cristão, é ver nossa liberdade de emitir nossas opiniões ser cerceada de forma transversal e velada pelos donos do poder, sem que isso possa ser diretamente atribuído a eles. Com muita facilidade nós brasileiros passamos a usar dinheiro digital, em relação a países mais desenvolvidos. Recentemente na Alemanha e nos EUA, me dei conta do uso pesado que eles ainda fazem de dinheiro de papel. Pode ser conservadorismo, mas acho que há um resquício de medo “de fundo” em entregar a totalidade de suas transações econômicas ao controle ou interferência de governos.

A agenda de cada um

Campos Neto tem sua agenda, como executor de políticas monetárias de um país de tamanho razoável. Jamie Dimon tem sua agenda, como alguém que tem muito a perder com a possível desintermediação bancária que as criptos têm gerado, e que as moedas fiduciárias digitais certamente aumentarão.

Ficar de olho nas motivações é bastante importante, e não acho que eles devessem se comportar de forma diferente, pois têm mandatos claros de seus “patrões” e como bons profissionais, precisam levá-los a cabo da melhor forma possível (meu artigo de ontem sobre Kissinger pode colocar este diplomata sob ótica parecida).

No que crer? Num mundo ideal, sejam criptomoedas ou moedas fiduciárias digitais seriam um incrível facilitador da vida comum. Num mundo que vem sendo mais e mais liderado por bandidos, o medo pode ser real.

Kissinger

Henry Kissinger morreu, e logo surgiram os artigos contra e a favor do seu legado. No conservador Gazeta do Povo um Op-ed de Filipe Figueiredo tasca o pau no legado de Kissinger (https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/filipe-figueiredo/o-legado-maldito-de-henry-kissinger-e-de-sua-lupa-de-ver-o-mundo/) por conta dos aspectos “manipuladores” e quase demoníacos do diplomata.

Já Niall Ferguson, seu biógrafo, o enche de elogios, pelo conjunto de sua obra (https://www.bloomberg.com/opinion/articles/2023-11-30/henry-kissinger-was-a-complex-man-for-a-complex-century).

Nada mais convincente do que uma opinião simples, direta, e profundamente afetada por interesses (Niall) ou fundamentos ideológicos (Filipe). Nasci e vivi ouvindo desde muito jovem o Repórter Esso, e depois o Jornal Nacional, entre outros, falarem de “o Secretário de Estado americano, Henry Kissingeeer”… com aquela voz de Heron Domingues empostada e bacana. Era a Guerra Fria, o Vietnam e a revolução cultural pela qual passamos, e na qual perdemos a santidade e a sanidade.

Kisssinger, contudo, não foi um “gênio do mal” ou um santo bem intencionado. Não há tal simplicidade em sua conduta, e o que o guiou, como guia toda diplomacia mundial decente (com seus eventuais Anões Diplomáticos, como é o nosso caso) na minha opinião, foi um pragmatismo que, ao fim e ao cabo, nos rendeu entre outras coisas, a queda do Muro de Berlim (de novo, minha opinião de leitor ávido mas não tão espero assim).

Kissinger foi sobretudo o cara mais inteligente da sala em quase qualquer sala que tenha frequentado. Era difícil acompanhá-lo em sua montagem de castelos de carta intelectuais que o levariam ao resultado pretendido pelo presidente da vez, e, principalmente, o interesse dos EUA.

Lendo um livro agora que relembra a invasão de Copenhagen pelos ingleses, no início do Século XIX, para capturar navios de guerra muito necessários para o Bloqueio Continental, contra as tropas de Napoleão, vejo um paralelo interessante: a colocação do interesse nacional sobre aquele de uma nação que, se não era aliada, não era inimiga. Entraram, roubaram os navios e foram embora. Por medo da França fazê-lo? Provavelmente. Mas muito mais porque eram necessários e eles ao fim e ao cabo PODIAM fazê-lo sem medo de retaliações. É um pragmatismo conhecido, e que levou a outras atrocidades (segundo alguns) como a “colonização” da Índia e sua entrega à Companhia das Índias Orientais, que a explorava e mandava parte pra His Britannical Majesty. Outros dizem que no fundo nem Índia existia, e que os ingleses entraram, juntaram tudo e “legaram ao mundo” o país que hoje conhecemos. A verdade está um tanto dos dois lados.

Kissinger foi pragmático, e ponto final. Ele não tinha muita saída em muitas das políticas que ajudou a traçar e implementou. Eram tempos bem mais bicudos, em termos de balanço de poder mundial – bom, estamos voltando a tempos igualmente ruins, creio. Ele fez o que achava – não sozinho, obviamente, mas junto com o Think Tank existente dentro de qualquer corpo diplomático. Identificaram a China como sendo objeto de uma “ameaça lateral” de natureza parecida com a da então URSS e trataram de implementar um plano que acabou dando errado: abrir o comércio do Ocidente (carreada pelos EUA) à China, na presunção de que a riqueza, a afluência de seu povo, faria com que o comunismo acabasse por acabar, como ocorreu na Europa Ocidental no início da Revolução Industrial, pelo simples fato de que o trabalhador estava ficando mais rico, não menos, a despeito das acusações (muitas delas corretas) de trabalho análogo à escravidão, etc.

Eu ia cair naquele jargão de sociólogo e historiador: “Kissinger foi um produto do seu tempo”. Mas todo mundo que pensa um pouco sabe que qualquer ser humano, no fundo, o é. Kissinger for mais do que isso. Sua personalidade complexa e controversa, aliado a seu jeitão bonachão e sua afabilidade faziam dele um político como poucos. Um Lula, digamos assim, com a mentira mas sem as contradições.

A lição que aprendo com Kissinger e seu legado é: O interesse nacional egoísta acaba sendo menos prejudicial ao mundo do que um internacionalismo artificial supostamente benévolo, assim como o espírito interesseiro e egoísta do capitalismo acaba provendo melhores resultados do que um comunismo preguiçoso e simplista. No fundo, em ambos os casos, tanto o internacionalista quanto o comunista são o mesmo cara, e tem tudo, menos o interesse coletivo, no coração.

PS: Em tempo (e depois de comentários pela minha falta de amor cristão, ao patrocinar a visão que expressei acima) – Jesus Cristo nos disse para sermos “mansos como as pombas, e astutos como a serpente”. Ou seja, não mandou ninguém ser burro ou cego. Em outro lado, a Palavra diz “maldito o homem que confia no homem”. Em síntese, confiança é algo raro, difícil de manter e fácil de perder. Sei por experiência própria – pelos amigos que perdi, quase sempre por fazer algo que não sabia que achavam errado e ofensivo – quanto os que expeli, talvez por razões iguais. O fato é que quando TODOS cuidam se seus interesses e sua vida ao mesmo tempo, há um equilíbrio notável. O que não acontece, por exemplo, quando alguns portam armas e outros não. Meu amor pelo povo do meu país estará preservado quando eu defender o que é melhor para nós, sem ferir o outro propositalmente. No entanto, entre ferir e ser ferido, ferirei sempre.

Talentos, a Parábola

Ao andar pelos meus sites favoritos hoje na hora do almoço me deparei com este artigo. Como cristão, estranhei o teor totalmente cristão dentro de um site de economia liberar como o do Instituto Mises Brasil. Lá no meio do artigo o autor revela uma visão que vi pessoalmente nos EUA entre os meses de Outubro e Novembro do ano passado: milhares, literalmente, de ofertas de emprego em lanchonetes, restaurantes, transportadoras e outras, sem preenchimento.

Leia https://mises.org.br/artigos/1857/a-parabola-dos-talentos-a-biblia-os-empreendedores-e-a-moralidade-do-lucro

A razão é esta:

“Além de o governo proibir aqueles que aceitariam trabalhar por menos que o salário mínimo, ele também cria um incentivo perverso para se recorrer ao assistencialismo: ninguém aceitará um trabalho que pague pelo menos o mesmo que o seguro-desemprego.

Preocupado que estou com o rumo dessa prosa de emprego versus “vale isso”, “vale aquilo”, vejo que não estamos diante de um problema nacional, mas um que está tomando dimensões fantasticamente complexas para um mundo que, de um lado, vai vendo sua força de trabalho minguar, por envelhecimento da população, de um lado, e de outro, vendo as tecnologias tirar do ser humano a capacidade de reflexão mais profunda, sobre quase qualquer coisa.

Países tentam, cada um a seu jeito, ajudar o cidadão. Pelo menos é isso que vemos, com exceção dos suspeitos de hábito, cujo objetivo é tão somente torná-los mais dependentes de um estado-pai. Aceito perfeitamente a visão de um socialista honesto, intelectualmente, de que, na visão dele, o estado deve fazer um papel de proteção e extensão de uma rede social para que a sociedade não sofra. Entendo. Não concordo, mas entendo.

Também enxergo no capitalista intelectualmente honesto uma visão de que é o cidadão que deve se ajudar, primariamente, e que a sociedade, voluntariamente, deve se organizar em torno da criação da tal rede de proteção social. Vejo mais mérito nessa ideia, e no fato comprovado de que funciona melhor do que um estado-pai, inchado.

Mas ok, se o indivíduo for intelectualmente honesto, eu aceito discutir, argumentar, à exaustão. Isso não me cansa, mas me anima. O que cansa é ouvir ladainha, decoreba, de gente que não tem o valor (ou os neurônios) para argumentar, e, caso convencido, mudar de opinião. Ainda espero mudar de opinião caso convencido intelectualmente, e de forma livre, que um estado-pai é melhor para o cidadão do que um bom emprego ou liberdade de empreender.

Entendo o capitalismo como meu sistema nervoso periférico, que trabalha por mim 24 X 7, e produz resultados que eu não obteria se, conscientemente, tivesse que pensar em respirar, em tossir, em espirrar, em reagir ao quente ou ao frio, e todas as complexas operações que são feitas descentralizadamente por meus neurônios, deixando para meu sistema nervoso central, meu cérebro, as atividades mais nobres de refletir, tomar decisões e fazer acontecer. Um governo é eleito para pensar e fazer o melhor, deixando a sociedade agir dentro de um sem-fim de atividades descentralizadas que garantem o funcionamento do “corpo” (a nação) – água e esgoto, circulação, respiração, engolir e deglutir, são atividades que é melhor deixar pra periferia. Já estudar e decidir, pode ser feito centralizadamente, mas apenas para o “macro”.

Um governo não deveria ser maior do que uma cabeça, em relação ao corpo: uns 7 a 8% no máximo, e não os 34% que corresponde hoje ao naco que o governo leva da atividade total da nação. E olha que o cérebro usa 20% da energia, mesmo representando 7, 8% do volume total (aqui incluo a cabeça toda… o cérebro mesmo dá 2% do volume total).

Deus, o dono e criador do bom senso, não comete erros. Se fez um sistema nervoso que no total do corpo humano implica em 10% (vá lá) do total, é essa métrica que eu acho que seria correta para o bom funcionamento da “máquina”.

Mais do que isso: até 2 anos atrás em tinha mais de 130 Kg. Estava me matando de diabetes, pressão alta, etc. O corpo não aguentava levar tanto peso. Hoje tenho 87 Kg, e quero baixar ainda mais. Estou bem, feliz, animado e disposto. Peso demais, para a mesma estrutura, é causa de morte. É uma doença, uma inflamação. Com o estado, não é diferente. O estado está doente, e nós pagaremos o preço.

Oremos!

Argentina e a Revolta de Atlas

Semana passada, em uma viagem ao Chile, um amigo querido me lembrou do livro da filósofa russa/americana Ayn Rand chamado A revolta de Atlas. Gosto mais do título em ingles, Atlas Shrugged (algo como “Atlas deu de ombros” – sabe aquele gesto de “tô nem aí”)… significa que o Gigante que carrega o mundo nas costas, o tal Atlas, acabou se chateando com tudo e “deu de ombros”… como o mundo está nos ombros dele, imagino que o mundo deve ter caído “no chão” e se espatifado em milhões de pedaços.

Hoje, lendo a epopeia argentina de autodestruição econômica, me lembrei do tal livro, que comecei a reler (havia lido há muuuuitos anos atrás). Dando de cara com manchete da Gazeta do Povo –https://www.infomoney.com.br/economia/pacote-argentino-preve-400-bi-de-pesos-para-linha-de-credito-alem-de-bonus-a-trabalhadores/ – não tive como conter a sensação de que os Atlas argentinos acabaram dando de ombros para o seu país.

Mas antes preciso fazer uma breve resenha do livro Atlas Shrugged para deixar todo mundo na mesma página. Para facilitar, e para ilustrar a todos como o ChatGPT é esperto, recorri a ele. Em vez de gastar alguns minutos fazendo minha própria resenha, passo a descrever o que um simples questionamento como “qual é a mensagem central do livro Atlas Shrugged” retornou, na tal IA:

Em resumo, “A Revolta de Atlas” é uma obra que promove o individualismo, o capitalismo, a razão e a criatividade enquanto critica o coletivismo, o altruísmo extremo e a opressão do governo. É uma obra polêmica que gerou discussões intensas ao longo dos anos e continua a influenciar debates políticos e filosóficos.

Chat GPT para dummies… (eu)

“A Revolta de Atlas” (Atlas Shrugged) é um romance filosófico escrito por Ayn Rand e publicado em 1957. A mensagem central do livro pode ser resumida em várias ideias interconectadas:

  1. Individualismo e Capitalismo: O livro promove fortemente o individualismo e o capitalismo laissez-faire como sistemas morais e econômicos superiores. Ele defende a ideia de que os indivíduos têm o direito de buscar seus próprios interesses e que isso é fundamental para o progresso da sociedade.
  2. A importância da mente criativa: “A Revolta de Atlas” celebra os criadores, inovadores e empreendedores como motores da economia e da civilização. Ele argumenta que a produtividade e a criação de valor são lideradas por indivíduos talentosos e criativos.
  3. A crítica ao coletivismo e ao altruísmo excessivo: O livro critica severamente sistemas políticos e econômicos que sacrificam os indivíduos em nome do coletivo. Ele argumenta que a busca do bem comum não deve ser feita à custa da liberdade individual.
  4. A defesa da razão e da lógica: “A Revolta de Atlas” valoriza a razão como a principal ferramenta do ser humano para entender o mundo e tomar decisões racionais. Ele critica a irracionalidade e o coletivismo que muitas vezes surgem quando a razão é negligenciada.
  5. A resistência à opressão do governo: O livro narra a história de indivíduos talentosos e produtivos que decidem “desaparecer” em resposta à crescente opressão do governo e às políticas de redistribuição de riqueza. Eles se recusam a ser explorados e fogem para criar uma sociedade própria.
  6. Ética da autossuficiência: Ayn Rand enfatiza a importância da autossuficiência e da independência individual. Ela argumenta que as pessoas devem buscar seus próprios objetivos e não depender excessivamente do Estado ou de outras instituições.

No livro, um grupo de intelectuais resolve fazer uma “greve” e negar à humanidade sua produção. Os tais “Homens que pensam” resolvem que vá todo mundo se lascar. Não querem viver nas costas de quem produz? Então comecem a produzir… e o pau quebrou. O legal é a definição dada a essa situação, frente à postura dos grevistas: governo centralizador e “paizão” é tão, mas tão ruim, que ele quebra a economia e acaba caindo por seus próprios deméritos. Tudo o que se tem que fazer é deixar que façam o que fazem melhor – bobagem.

O que tem isso a ver com a Argentina? Tudo. A Argentina é o exemplo mais perfeito e acabado de como uma série de governos semi-ditatoriais, ou abertamente ditatoriais, que privilegiam “o social” em detrimento do indivíduo e suas escolhas individuais podem fazer para acabar com um país maravilhoso, fértil e de gente educada. Nada me parece mais próximo da fábula de Ayn Rand do que o Brasil de hoje, a Argentina de hoje (e de sempre), a Bolívia de hoje, o México de AMLO, e o Chile… opa… o Chile nem tanto.

Vindo de uma palestra sobre o Chile na semana passada, dada pelo meu ilustre colega de Praxity, Ignacio Gepp, percebi que ali a “guinada à esquerda” acabou não sendo o que pareceu ser. Parece que lá, Sebastián Piñera, que havia saído da presidência com 8% de aprovação (ou seja, um Temer da vida) volta à cena como a terceira opção em um novo pleito presidencial. Além disso, a tal nova constituição que parecia muito com uma colcha de retalhos de ideários de esquerda foi rejeitada menos de 1 ano depois da eleição do atual presidente, Boric, por nada menos que 62% da população – lá, diferentemente daqui, a população tem que aprovar a nova Carta Magna no voto.

Uma nova constituição está sendo elaborada, por um congresso menos à esquerda, e parece que incorporará alguns temas caros à sinistra, mas com manutenção do bom senso econômico que tem caracterizado o Chile há décadas, e que o coloca como o maior PIB per capita da América Latina já há algum tempo.

Síntese do babado todo: não adianta correr. Pode dar a economia à esquerda à vontade. É questão de tempo até quebrarem tudo, e devolverem em frangalhos ao povo. “Ah… mas e a China”… bom, a China é um exemplo de aprendizado confucionista: melhor ficamos com o poder político mas deixemos a quem entende a iniciativa privada. Não que eu creia que isso vai durar. Acho que não. Assim que a China se sentir “dona do mundo” ela retornará ao ideário de dominação também econômica, além de política, e o caos sobrevirá.

Deus nos ajude e dê vontade de não querer fazer greve de ideias… vontade dá.

Tax Reform in Brazil

Brazil has a tax reform in discussion in the Congress, as I write. Let us be objective about it and let me convey to you all the changes proposed. They will certainly simplify the system, which is quite complex, but at the same time will have some important side effects that must be considered. Let`s check the basis, and then I will comment on what I see as really important:

1 – Present VAT System (State and Federal)

Present VAT system comprises 3 Federal taxes, one which is a classical VAT taxe and two that may or may not be VAT (alternatively, a Tax on Sales):

FEDERAL:

  • IPI – Excise Tax or Tax on Industrialized Products
  • PIS and Cofins (basically the same legislation)

These will be substituted by the CBS – Contribution on Goods and Services (Contribuição sobre Bens e Serviços)

STATE/COUNTY:

  • ICMS – State VAT, a “full VAT” tax
  • ISS – Not a VAT, but a “Tax on Services” levied, in fact, at County Level

These will be substituted by the IBS – Tax on Goods and Services (Imposto sobre Bens e Serviços)

One important change is that the VAT will, from now on, be collected at the ORIGIN of the product, and not at the DESTINATION. This will certainly ensue a series of guerrillas among states. The largest ones, like São Paulo, always complained that produced the largest portion of goods and services, which were then collected at the non-producing states (usually the poorer states). With over 30% of the Brazilian population, São Paulo has always felt strongly against it.

EXCISE TAX – Selective CBS:

Goods and Services that are considered hazardous to the environment or to the health of population will suffer additional taxation, added to CBS rates (tobacco, alcohol, etc).


RATES and LEVELS:

All taxes, CBS plus IBS, will have one joint rate, and will be classified under 3 basic levels:

Standard Rate – Which is still not determined and will be established by the Senate.

Reduced Rate – Predefined as being 50% of the Standard Rate, and therefore depending on the Senate, also. Some products and services defined preliminarily as reduced are:

  • Education
  • Health services
  • Medicine and medical devices
  • Public transportation
  • Fishing, agriculture, forestry, and plant based products extraction
  • Food basket – the contents of it are still to be defined and may vary by region of the country
  • National artistic and cultural activities.

Exempted – Zero rate applied for some products and services such as:

  • Public Transportation
  • Some Medicines and Treatments
  • PRO UNI – The national program “University for Everyone”
  • Social Programs, such as food coupons, etc.
  • Individual Rural Producer whose annual gross revenues are up to R$ 3.6 million

2 – Other Federal Taxes

Tax on Property – IPTU

IPTU will have changes in the collection method and will be defined by federal decree.

Tax on Automotive Vehicles – IPVA

IPVA – will be reintroduced with a progressive character related to the pollution generated by each vehicle. IPVA will apply to jets and boats.

Tax on Wealth transmission, donations and inheritance – ITCMD

A new ITCMD with have progressive rates will be levied at the State where the donor is domiciled. Currently, it is based on where the Asset is located. This is an important change.

3 – Manaus Free Trade Zone

Brazil has only one Free Trade Zone – the “Zona Franca de Manaus” (ZFM). Manaus is in the middle of the Amazon Basin Area. The rationale for ZFM is that of creating ordere3d and sustained employment in a region that would otherwise be a void in northern Brazil. Therefore, despite the clamor for the extinction of ZFM, it will remain with its present role, which has been quite a success for the region, in the last decades.

4 – National Simplified Taxation System – SIMPLES

Micro and Small size companies will be able to maintain the reduced and simplified taxation method, as is today, including the exemption of formal bookkeeping records, which frankly is a disservice to these businesses.

Notwithstanding, Micro and Small sized companies will be able to opt to remain in the regime or leave it, to another taxation method (today, Presumed or Real Profit methods of taxation).

Other Aspects

We will not delve into specific aspects such as transition periods (8 to 50 years of transition period, depending on the taxation) nor in the specific methods of compensation for loss of collection among States and the Union. This is where things can go south in all the negotiations, with Governors of smaller states claiming for more compensation, and 5.570+ Mayors in different sides of the win-lose spectrum of this battle.

More to come!

ChatGPT, PIX, DigiFidus e nós, Juntos e Shallow Now…

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Morro de medo de coisas que não entendo… mas isso é natural. Quanto mais limitado você é, ou quanto mais limitado você admite que é, mais medo você terá de coisas que não entende – principalmente quando todo mundo em volta de você diz entender.

Hoje, todo mundo está encantado com uma nova modalidade de inteligência artificial, o ChatGPT, que parece fazer traduções melhores que muitos tradutores juramentados e consegue criar histórias e até músicas, baseadas em dados alimentados e “aprimorados”. Meu cérebro reptiliano (chamemo-lo “Jacarito”) diz “sei não, hein”… e tem aquela urgência de brigar ou fugir.

Me senti, e ainda me sinto assim com relação a outros fenômenos do mundo atual, como o PIX e as Moedas Oficiais Digitais ou algo como “DigiFidus” (desculpem o neologismo, mas tá difícil ler algum mais adequado). Bancos devem estar tremendo diante do potencial do PIX em relação às pretensões do Brasil em “desintermediar” as operações financeiras. Já um Real Digital, baseado em blockchain, pode criar uma situação de controle total e absoluto sobre a vida financeira de todo mundo que estiver “on-the-grid” (conectados, ou bancarizados).

Indo de trás pra adiante:

PIX

É uma coisa mágica, e que não vemos em nenhum outro lugar do mundo, até o momento. Passei 2 meses nos EUA recentemente, com minha esposa, e dificilmente uma área me deixou mais frustrado, no país mais desenvolvido do mundo, do que o setor bancário. Nessa área, damos de 10 a zero em qualquer outro país, China incluída. Somos feras em automação bancária. Então por que o PIX mete medo em Jacarito?

Temo que eu não tenha mais nenhuma privacidade financeira, o que contraria frontalmente a Constituição de 1988, em seu Art. artigo 5o., incisos X e XII, prevê garantia de sigilo bancário “fundamentado no direito à privacidade e à intimidade, a inviolabilidade dos sigilos das comunicações telegráficas, correspondência de dados e das comunicações telefônicas.”. Ações práticas da Receita Federal, como SPED, ECF e ECD, já fazem um papel bastante bom em, sob qualquer aspecto prático, acabar com o sigilo de empresas.

Na prática, isso já foi pras calendas há tempos, como muitas coisas previstas, inclusive em cláusulas pétreas na CF88, e que certamente virão assombrar a todos, à esquerda e à direita, sempre que algum Supremo deseje brandir poder em nossa cara.

Há razões de sobra para adorar o PIX. É grátis (por enquanto), é simples e inclusivo. O Povão adora, e com razão. O meu medo não reside nisso. Meu medo se dá pelo fato de que, se temos um Banco Central independente hoje, temos um PIX “blindado” de medidas antidemocráticas. Está na rua, e na cabeça dos governantes da vez, o desejo e a possibilidade de tornar (senão de direito, mas de fato) o Bacen, de novo, em um apêndice do Governo. O COAF já saiu de lá, e portanto, é simples prever um certo esvaziamento contínuo das funções do Banco. A partir de meados de 2024, um novo presidente do Bacen assumirá, à “imagem e semelhança” dos governantes da vez. E quem me garante privacidade ou “licitude” no uso das informações financeiras derivadas do PIX?

Teoria da Conspiração? Pode ser, claro. Afinal, Jacarito, cá dentro de mim, tem medo, e foge… ou ataca…

DigiFidus

Um passo lógico, subsequente, a ser dado pelos controladores da Moeda, é a criação de Reais (R$) totalmente digitais. Quando da criação das primeiras moedas virtuais, como BitCoin e outras, imediatamente veio à minha mente o fato de que governos não gostam de competição. Sua vontade de controlar desaguaria – creio que desaguará – na criação das DigiFidus – moedas digitais baseadas em tecnologia blockchain, mas controladas e lastreadas fiduciariamente pelos governos centrais – a começar pelo Brasil, creio, que é ponta de lança nessas tecnologias.

A pergunta que Jacarito se faz então, é a seguinte: O que impede um Bacen dotado de capacidade de processamento de dados quase infinita, faca-e-queijo na mão, de varrer do mapa todo o sistema bancário nacional, e concentrar em suas mãos toda a capacidade de criar e controlar contas bancárias, oferecer (e negar) empréstimos e controlar toda e qualquer transação financeira? Teoricamente, nada.

Jacarito se encolhe num canto, no chão da jaula desse zoológico chamado Brasil, e balança o rabo ameaçadoramente a quem quer que chegue próximo. Como não ter medo de um governo que tem tal ubiquidade? Tal capacidade de fazer o que quer, literalmente, com todo e qualquer player da economia?

Se o governo é de direita, pode perfeitamente beneficiar igrejas e ONGs de sua preferência; pode fomentar o agribusiness e até facilitar a vida de quem quer garimpar onde não deve, em tese. Pode disruptar ONGs “inimigas” e varrer do mapa, sem deixar rastros, instituições mais à esquerda.

Se o governo é de esquerda, pode perfeitamente bem acabar com toda e qualquer instituição religiosa, lascar com a vida das forças armadas – financeiramente, e ainda criar embaraços horríveis à vida de reflorestadores e do agro brasileiro. Em mãos “estrangeiras”, pode ser usada em benefício de potencias estrangeiras, em linha com suas opções ideológicas.

Se o governo um dia for “centrão”, aí sim estaremos lascados, pois a necessidade de malas de dinheiro circulando em aeroportos, ou caixas de papel pintado de R$ em apartamentos alugados serão coisa do passado. Tudo devidamente carimbado pela autoridade que mandar na vez (essa gente tende a ser bem eclética no compartilhamento do poder).

À esquerda e à direita, passando pelo centrão (ou centro), os riscos para a vida da sociedade são evidentes. Resta saber se os Jacaritos dentro de todos nós aceitarão isso passivamente, ou se algum Supremo nos impedirá de demonstrar nossa indignação ou desejos.

ChatGPT

Isso parece não ter nada a ver com os pontos anteriores, mas Jacarito discorda e me pede pra contar o que “ele” acha.

Como toda boa tradição de Teoria Conspiratória, sempre há um elemento de tolhimento da capacidade de interpretação da realidade, até que o “fato consumado” já tenha acontecido e seja tarde demais. O filme de mesmo nome quase me matou de medo, pela possibilidade de que aconteça um dia. Esquerda e direita sempre competem pela primazia de pichar nas costas do outro lado a capacidade de fazer “isso”.

ChatGPT é um fenômeno. É preciso passar dias esperando uma vaga pra acessar o sistema. Dentro dele, um mundo de possibilidades emerge, desde a confecção de teses fajutas de mestrado e doutorado, até a tradução (excelente, por sinal) de documentos. Dá até pra ajudar bastante na escrevinhação de códigos de computador.

O que Jacarito teme, no que tange não só a ChatGPT, mas a qualquer espécie de inteligência artificial, é o que o livro “The Loop” (Jacob Ward) sub-titula como “Como a tecnologia está criando um mundo sem escolhas, e como lutar contra isso” (tradução minha, sem suporte do ChatGPT, graças a Deus).

O que Jacob Ward nos chama atenção é para o fato de que IA (Inteligência Artificial) dificilmente é algo “neutro” ou cientificamente orientada. Sempre tem um “bias”, uma pegadinha. Se você pergunta algo que o sujeito (de carne e osso) por trás da ferramenta, considera inadequado, politicamente correto ou que ele ache que vai ferir alguma suscetibilidade, o ChatGPT vai retornar uma mensagem padrão dizendo que não comenta sobre este assunto, e ponto final.

Por outro lado, outro dia vi que o ChatGPT retornou algo sobre a morte de Ayrton Senna num acidente com Satoru Nakajima no GP… do Brasil… uns anos antes da morte efetiva. Por que? Sabe-se lá. O GPT ainda tá aprendendo (Talvez GPT signifique Getting Productive Tips, ou “Obtendo dicas produtivas”).

Num mundo de seres cuja atenção não dura mais do que 20 segundos, e cuja capacidade de teclar é milhares de vezes maior do que a de refletir, onde é que o ChatGPT entra em jogo? O Livro alude a isso da seguinte forma:

“While I believe it’s clear that the mental and physical health of entire generations could be at stake, I also believe that capitalism, culture, and our conviction that we are in charge of our own destinies are blinding us to the threat.”

(Embora eu entenda por claro que a saúde física e psíquica de gerações inteiras possam estar em jogo, eu também acredito que o capitalismo, a cultura e nossas convicções de que estamos no controle de nossos próprios destinos nos está cegando para a ameaça [presente]”

The Loop, Jacob Ward

Como, meu Deus do céu, não estar “blinded” (cego) para a ameaça que a IA representa para nós, quando a Lei do Menor Esforço é tudo o que nos rege, na sociedade atual? Como não deixar “a vida nos levar”, ainda que a “vida” seja aquela ditada por nós por uma IA, frequentemente (senão sempre) programada para nos dar uma resposta que nos imbecilize, nos faça ainda mais presa de um mundo feito para nos moldar?

O Livro segue dizendo que empresas, como Facebook, Google, etc, usam essas ferramentas de IA para nos conduzir, tanger, como gado, para um destino especificado internamente. O objetivo parece ser usar uma tecnologia que não entendemos para retirar de nós a capacidade de reflexão (*)

Tudo parece Cooperar para nosso Bem… até que não…

ChatGPT, PIX, DigiFidus… tecnologias que, há algum tempo atrás, seriam difíceis de não qualificar como “milagres”, ou “magia”. Tecnologias que ainda hoje a maioria de nós não entende, não faz questão de entender e tem raiva de quem entende.

Some-se a isso o fato de que os grandes Curadores da Sociedade, a Imprensa, os Acadêmicos e Filósofos parecerem estar a serviço das mesmas forças que programam os algoritmos das diversas IAs, das quais “bebemos” sem reflexão, e está dada a confusão, e a escravização.

Tudo parece cooperar para nosso bem, e nossa tranquilidade, até que não mais seja verdade. Seja você de que convicção política for, saiba que estamos, todos nós, diante de uma aterrorizante possibilidade de virarmos uma “Idiocracy” (**)

Pagaremos pra ver? Jacarito não quer…

(*) O Livro não é textual sobre isso, mas sua sinopse sim.

(**) O filme é bobinho; o argumento é profundo.

Ram Charam e o Caixa-Rei

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Li e envio aqui o link do artigo recente do famoso Ram Charam sobre a situação economica atual, no mundo, e a necessidade de preservação de Caixa – “Cash is King”. Meu amigo, Dr. Marcos Leandro Pereira, reproduziu e comentou sobre o artigo, e o faço aqui, não só em deferência à sua ilustre opinião, como ao próprio Charam, obviamente. Não faço inteiramente minhas as opiniões de Charam no que tange ao Brasil, especificamente.

Entendo o espírito do artigo, e gostei muito, Marcos. Talvez a única consideração é o cuidado que devemos ter no conceito “cash is king” no Brasil. Vivemos em meio a uma recente e crescente onda de incertezas que na prática nem sabemos onde vai dar. Coisa boa, parece que não será. Assim, “cash may not be the king here; hard assets do”… ou seja, melhor, aqui, talvez seja buscar portos mais seguros. O estranho é que vemos investimentos estrangeiros entrando no país e brasileiros buscando abrigo no exterior. Lula é uma “unanimidade midiática” em quase todo lado que eu vou, com raras e honrosas exceções (alguns estados nos EUA, por exemplo). Ninguém parece se dar conta da raiva e do espírito de gastança pública, do “re-loteamento” do executivo em Brasília, e das insanidades que tomaram conta do esferas do poder federal (fora as ações “fora da casinha” do STF, claro). Assim, hard assets me parecem ser algo, no mínimo, a ser considerado num país como o nosso…

Eu mesmo, in LinkedIn

https://www.linkedin.com/search/results/all/?fetchDeterministicClustersOnly=false&heroEntityKey=urn%3Ali%3Afsd_profile%3AACoAAAIktsUB–4xilNMVHa64daLSzgynzdU9CA&keywords=marcos%20leandro%20pereira&origin=RICH_QUERY_SUGGESTION&position=0&searchId=39f7e8c2-dadc-42da-be84-ffa33fb1a041&sid=hcT

Com essas breves palavras acima, creio que introduzi o assunto que ninguém quer falar, aqui, e que “tá dominado” no exterior. A máquina de propaganda, muito possivelmente com nossa grana, perpetrada pelo partido no poder, o “Labors-Nine”, pra quem entende, varreu do mapa toda e qualquer consideração sobre o dono do partido, no que tange a corrupção e tendências não democráticas, além de uma eleição pra lá de suspeita (não me refiro aqui a urnas, necessariamente, mas à militancia de um TSE que, no meu ver, atuou para influenciar a campanha política de forma decisiva).

Loolah no Exterior

Tanto em boa parte dos EUA (e em sua mídia mainstream, com certeza), quanto na Europa, essa “dominada” por uma visão de mundo de esquerda, começando pelos seus principais players na mídia, Loolah (sorry pela escapada covarde na soletrada) é um semi-deus, provavelmente candidato ao Premio Nobel da Paz.

Faz-se uma força hercúlea e desproporcional, que eu não sabia que era possível ser exercida por um “Anão Diplomático” (thanks, Israel) como o Brasil. O homem que ficou preso por mais de 500 dias, julgado e condenado por mais do que uma simples meia-dúzia de juízes de várias instâncias, culpado como o capeta, volta à cena do crime (cena em español, porfa) incensado por quase metade dos votantes do país, e nos braços da imprensa nacional.

A Rússia já disse que vai considerar a “proposta de paz” feita pelo sujeito para a terminar a guerra na Ucrânia, como se proposta viável alguma tivesse sido feita. Isso, obviamente um coup-de-main para elevar o status da Rússia junto a nós e reforçar o caráter de estadista de Loolah, foi noticiado como verdade revelada. Se o Kremlin tivesse pedido a canonização do desfeliz junto ao Patriarca da Igreja Ortodoxa Russa, eu ficaria menos espantado…

Independentemente disso tudo, a dicotomia entre o que o cara fez e é e a visão que o mundo tem dele é de matar de raiva. Ai dos que ao mal chamam bem, e ao bem, mal.

Loolah no Brasil

Aqui o negócio é um tantinho diferente, a despeito da força da mídia em lavar ratazanas. Uma boa parte do eleitorado e dos formadores de opinião, esses (nós) frequentemente tachados de burros e “gado”, sabemos claramente que se trata de uma aberração, o que vivemos hoje.

Não tenho amor algum por Bolsonaro, e o culpo por várias coisas: a)desconsideração e apoio no desprestígio à Lava-Jato; b)briga desnecessária e burra com a imprensa mainstream nacional – que o isolou; c)desconsideração com efeitos da vacinação, o que não ajudou em nada num momento difícil ; d)transito atabalhoado e burro junto ao STF e Congresso – só pra ficar nos exemplos mais gritantes. Bolsonaro foi um cara que correu uma maratona sozinho, e chegou em segundo lugar. Impressionante a performance dele e de seus pimpolhos, sempre rápidos no gatilho pra falar, sem pensar.

Mas tenho que admitir que o cara teve méritos muito maiores, a despeito de tudo isso – méritos esses parcialmente desfeitos pela mesma mídia maistream que ele desprezou: a)controle da inflação e retomada em “V” da economia; b)ausência de casos de corrupção – pelo menos comprovados e vultosos – em seu governo; c)excelente condução da política de infraestrutura, terminando obras inacabadas – uma constante em qualquer governo anterior; d)excelente tratamento dado ao setor mais competitivo do país – o Agro.

Isso tudo, o que tem a ver com o artigo de Charam?

Tá… e daí? Daí que, como eu disse, estamos diante de um caso de esquizofrenia econômica. Claro que podemos ter uma reviravolta para melhor, com a demissão de Haddad, que é uma nulidade em vários segmentos do conhecimento humano, mas principalmente em economia. Claro que podemos ter uma crise de “Lula 1” com mais “paz-e-amor”, quando este se dê conta de que não vai “dominar tudo” por aqui como os pares dele, Cristina, Ortega e Maduro, para ficar somente nos exemplos mais próximos, fizeram em seus países de origem. Claro, por fim, que temos a possibilidade do Congresso ter um pingo de decência e começar a exercer seu poder, independentemente de loteamento de cargos e cooptação.

Mas não creio, sinceramente, que isso vá ocorrer. Creio sim que haverá uma deterioração do cenário econômico por aqui. Diz-se que em Brasília, depois de 2 meses de governo, quase 2/3 dos cargos do segundo escalão ainda estão por ser “distribuídos”. Por que? A se manter o modus operandi usual, esses cargos estão a espera de suas respectivas “éxcélênssias”, que pagarão por eles com o toma-lá-dá-cá costumeiro, sem vergonha ou respeito, e, francamente, sem pensar no amanhã.

Diz-se também (não posso provar, óbvio) que o sistema de “fale com fulano”, e “fulano resolve isso” já está de volta a Brasília. Todos lá estão felizes. Afinal, deu-se ali o retorno do Jedi-mor.

Concluindo…

Assim, só restará ao Brasileiro, se eu estiver certo, os “Hard Assets”, ou seja, “coisas” que são mais difíceis de serem garfadas, como terras, imóveis, e, lá no fim da descida da ladeira, ouro, outros metais preciosos, etc. No fim da ladeira há um poço em que o conceito de “Cash is King” (respeitado em todo mundo, por boas razões) encontrará pouca realidade fática no país, se a moeda se corroer (enquanto o Campos Neto lá estiver, duvido um pouco), se os preços dos ativos em bolsa virarem fumaça, os títulos do governo subirem de nível de risco e, por fim, se a inflação, vilão nota mil de qualquer população, voltar com força.

Aqui, Cash will be the Executioner. Melhor fazer o que muitos estão fazendo, enquanto dá, e ter um pé-de-meia tão seguro quanto possível, a salvo das mãos do governo…

Passado Movediço

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Ontem fomos todos tomados de surpresa por uma decisão do STF que é, para dizer o mínimo, insólita. A imagem abaixo, do Valor, conta a história com relativa exatidão:

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Vou dar as minhas razões particulares, como auditor independente, conselheiro e cidadão, do porquê acho isso tudo tão absurdo.

Insegurança Jurídica

A síntese desse “pagode” é relativamente simples, pelo que pude depreender: você é uma empresa, contribuinte, recebe uma multa, com ou sem razão (tsk, tsk…) e recorre em instância administrativa, e termina na instância judicial. Lá pelas tantas, o STJ, ou qualquer tribunal que seja considerado “definitivo” como corte decisória, te dá ganho de causa, ou seja, considera-se o assunto passado em julgado. Pois bem, com base nisso, a empresa passa a ignorar os efeitos financeiros da mesma – se estava provisionado o valor da contingência, reverte a provisão; se não estava (seja por falta de critério contábil ou por opinião favorável de seus advogados, aceitas por seus auditores independentes), mantém tudo como d`antes, fora dos livros.

Agora, por essa decisão, se o tal STJ deu uma decisão favorável e, após isso, o MESMO tribunal passa a decidir de uma forma oposta, o fisco terá o direito de te cobrar a dívida, antes considerada não devida, da mesma forma, a partir do momento em que o tal tribunal deu decisão em contrário.

Efeitos

Eu fico aqui me perguntando como vou proceder com meus clientes. O QUE vou ter que re-re-revisar, para tentar entender que “causos” foram já julgados no passado e considerados como sendo irrelevantes ou afastados do balanço da empresa, eu terei que dizer “sinto muito, provisione de novo porque o STJ reverteu – não a sua – decisão e agora você corre o risco de ver sua grana penhorada pelo fisco…“. Como diria Noel Rosa, “com que roupa / eu vou”. Não sei, e estou aqui matutando quais efeitos adicionais isso pode ter. Alguns deles abaixo, para raiva, medo frustração ou choro dos colegas e amigos.

Fusões e Aquisições

Processos de fusões e aquisições no Brasil já são uma dor de cabeça, justamente porque aqui no Brasil, o conceito de “responsabilidade solidária” atinge seu ápice mundial: se o seu predecessor, na sociedade, cometeu um crime tributário, você, que adquiriu a empresa – sabendo ou não do fato – é responsável pelo mesmo. O CNPJ é responsável. Não quem perpetrou o ato, do ponto de vista decisório. Com isso, os processos denominados de Due Diligence são muito mais complexos do que em qualquer lugar do mundo. Honorários de Due Diligence aqui costumam ser demasiado caros, em relação a (quase) qualquer outro país de mesmo porte.

E agora, o que dizer ao investidor? “Sabe a Due Diligence que eu fiz há 2 anos? Pois é, o “escrow” não é mais suficiente, sabe… e não é porque erramos a mão. É porque ressuscitaram um assunto morto e enterrado. Tanto eu quanto seus advogados concordamos que na época não havia qualquer risco aqui”…

Auditoria Independente

Nem sei por onde começar aqui. Imaginemos o caso mais rumoroso dos últimos tempos: PIS e Cofins na base de cálculo do ICMS, julgado em última instância pelo STF, que, em tese, colocou uma pedra na sepultura e selou a cal e canto. Todo mundo correu para recuperar a grana paga indevidamente ao fisco federal. Ora, cobrar 9,25% sobre, digamos, 12% de ICMS, implica em uma “super tributação” de 1,11% -impacto direto sobre preços e custos, e, necessariamente, sobre a atividade econômica fabril e comercial como um todo.

Empresas de todo o Brasil tiveram o direito de recuperar esses montantes, e nós, auditores independentes, diante de um fato consumado, nada mais temos a fazer senão concordar que já não há efeitos aqui, exceto aqueles contábeis advindos dessa recuperação do gasto tributário passado excessivo.

Suponhamos que amanhã, um “outro STF” decide julgar exatamente o oposto. Se entendi bem, o fisco federal, e seus supercomputadores Cray, vão imediatamente identificar todos os contribuintes que ganharam ações contra a Receita, e cobrar tudo de novo, com juros, multa e correção.

A questão é: o QUE considerar contingência e o que não? Para as demonstrações contábeis de 2022 (dezembro), sob auditoria neste momento, não sei ainda o que teremos que rever a ponto de saber o que terá que ser reconsiderado. Pode ser (ainda nem medi isso) que alguns clientes tenham ganho ações no passado que já tenham sido objeto de julgamento diferente.

Estado de Coisas

Parece coisa de “direitista radical”, “bolsonarista” ou coisa que o valha. Não é. Confesso que não sou lá tendente a teses de esquerda, conquanto concorde com algumas delas, en pasant. Mas o fato é que temos diante de nós uma situação que sequer sabemos onde vai nos levar como economia.

O “Estado de coisas” é de tal ordem movediço que faz a célebre frase atribuída a Pedro Malan – “No Brasil até o passado é incerto” uma verdade absoluta.

Segunda Linha

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Ao longo da minha carreira profissional em Auditoria Independente, já fiz parte de uma firma de auditoria de Primeira Linha (Andersen) e várias firmas e alianças de “Segunda Linha” (Praxity, RSM, Russell Bedford). Indistintamente recebi críticas, de qualquer lado e sob qualquer posição, em qualquer das empresas. Uma porque “despejava um caminhão de estagiário” para fazer o trabalho de auditores, outras porque “não tinham o tamanho e não passavam ‘confiabilidade’ necessárias ao mercado”.

Ouvi isso com muito cuidado e respeito, e, como profissional, com uma doída pontada no fígado, por não expressar o que realmente existe na parte da Contabilidade que se chama Auditoria, e por que os resultados de nosso trabalho às vezes nos fazem dar com os burros n`água junto à opinião pública.

O fato mais clamoroso e mais recente diz respeito às Lojas Americanas (AMER3) e a “maior fraude contábil da história do mundo”, segundo alguns veículos de comunicação.

Mais recentemente, a Dra. Patrícia Punder, indicada como Perita para a AMER3, pelo juízo da Recuperação Judicial, declinou do trabalho pela via de uma argumentação enviesada e francamente (meu julgamento) exangue de conhecimento profissional:

Em entrevista a VEJA, ela apontou a falta de acordo financeiro e, sobretudo, a impossibilidade de trabalhar com uma das quatro maiores empresas contábeis especializadas em auditoria no mundo (Deloitte, EY, KPMG e PwC) como fatores determinantes para a decisão de abandonar o caso. Fora isso, ela também disse que temia por sua integridade física com o desenrolar das investigações contra os acionistas…

https://veja.abril.com.br/economia/o-alerta-da-advogada-que-renunciou-trabalho-como-perita-em-caso-americanas/

A advogada, que não sabemos que nível de conhecimento contábil e de auditoria, especificamente possui (não duvidamos que os tenha), informa que sem uma das quatro maiores firmas de auditoria do mundo não pode investigar os resultados do trabalho de… uma das quatro maiores firmas de auditoria do mundo.

Mais adiante continua da seguinte forma:

Segundo a advogada, a recusa das grandes empresas acende um sinal de alerta no caso. “Isso me preocupa muito, porque eu precisaria ter uma auditoria de primeira linha, pois o caso é muito complexo”, diz ela, afirmando que chegou a contatar auditorias de “segunda linha”, mas que, por questões de confiabilidade, o ideal seria trabalhar com uma das chamadas “Big Four”.

Idem

Dois aspectos fundamentais que eu gostaria de deixar registrado

Primeira ou Segunda Linha

Trata-se de uma demarcação não existente, do ponto de vista técnico, e muito menos no que tange à qualidade do que pode ser feito por uma auditoria “qualquer”, que detenha a técnica necessária. Esta técnica deriva do conhecimento das Normas Brasileiras de Contabilidade de Auditoria Independente de Informação Contábil Histórica (NBC TA) e das Normas Brasileiras de Contabilidade, que, no Brasil, administra (Lei 11.638/2007) o regramento contábil brasileiro, derivado dos IFRS -“International Financial Reporting Standards” (Ou Padrões Internacionais de Relatórios Financeiros).

Quando no Board da RSM, vivemos um embate, na Europa principalmente, contra cláusulas que se chamam “Big Four Only” – são cláusulas em que uma reserva de mercado é criada por agentes do mercado, a fim de que se reconheçam somente as auditorias de Big Four como sendo válidas para chancelar Demonstrações Financeiras/Contábeis.

Importante deixar claro que não há NADA, absolutamente, de minha parte, contra as Big Four – muito pelo contrário – imenso apreço técnico e amizade por vários sócios e profissionais dessas empresas, que realmente são usinas de fabricação de ferramentas de qualidade técnica. Apenas que não são as únicas, e nem sempre estão na vanguarda das inovações. Portanto, não estou aqui tratando de dividir o mercado em “eles” e “nós”. Estamos tratando da inadequada visão – do mercado – de que existe um abismo técnico intransponível entre as firmas e alianças denominadas “Mid-Tiers”, e as grandes firmas. Aliás, o “gap” de faturamento entre elas é cada vez menor em termos percentuais. Cá entre nós, dizer que uma firma de faturamento de USD 8 bilhões é “necessariamente pior” do que uma de (digamos) USD 30 bilhões é o mesmo que dizer que o carro “A” é melhor que o “B” porque a montadora “A” é 10 vezes maior do que a “B”, o que faz menos sentido, por exemplo, quando se tem um carro com um tridente em cima do capô, só pra ficar num exemplo.

Eu não ousaria chamar um advogado de “segunda linha” porque ele não pertence a um mega escritório. Aliás, a profissão de advogado, diferentemente da do auditor, não teve o nível de concentração inacreditável que temos hoje na nossa área. A razão é que os advogados não admitem determinadas práticas chamadas “comerciais” dentro de suas competências, e são zelosos delas, mundo afora. Ao contrário, talvez os maiores juristas do mundo não estejam debaixo de mega firmas, mas sob sua própria luz técnica. Nem por isso dizemos que são de segunda linha.

Caráter Personalíssimo

Um outro fato que talvez passe despercebido do respeitável público é o caráter personalíssimo dos trabalhos, tanto de advogados, como de contadores e auditores. O sócio responsável, e só ele, deveria responder por eventuais problemas e falhas técnicas, devidamente comprovadas. O caso da Andersen, no imbroglio da Enron, é um exemplo clássico dessa máxima. Nancy Temple e David Duncan, sócios da firma, foram apontados como tendo cometido o ato que levou toda uma firma centenária à bancarrota, por perda de sua reputação. A Andersen foi ainda condenada em primeira instância por destruição de provas, o que foi revertido pela Suprema Corte dos EUA anos depois, em 2005. Sob qualquer aspecto, me parece que se trata sempre da relação entre o Sócio Responsável e o Cliente.

É natural que clientes pressionem o auditor independente a ver as coisas sob o seu prisma. E cabe ao auditor independente refutar, quando aplicável, qualquer consideração que não tenha eco na técnica. Quanto a técnica é vaga ou interpretativa, existe latitude para pensar em um lado ou outro do espectro de decisão. Porém, nunca em detrimento da realidade – e, no caso Americanas, em detrimento da verdade a ser dita ao acionista e ao mercado (o próprio Arthur E. Andersen costumava falar seu “mantra” pelas esquinas da firma – “Think clearly, speak clearly” – pense com clareza, fale com clareza).

Pressões

Talvez o que norteie a independência do auditor não seja (creio que não é) o tamanho da organização da qual participa, nem, como alegou a Dra. Patrícia Punder, a existência de tecnologia ou capacidade técnica para tecer julgamento sobre as contas de uma organização do tamanho da AMER3. Com o avanço das técnicas de Big Data, Data Warehousing e Screening de dados, basicamente qualquer auditor, ou grupo de auditores, tem condições de julgar saldos contábeis, independentemente de sua magnitude, dados o TEMPO e o ACESSO adequados. Disso não tenho dúvidas. Tampouco disputo competição técnica com colegas de Big Four. Creio que empresas de auditoria devidamente qualificadas para tal, sejam elas Big Four of Mid-Tier, detenham suficiente conhecimento para liderar – se disposição e incentivo tivessem- equipe de auditoria para cliente de quase qualquer tamanho. A única limitação a ser identificada e leva em conta é a capacidade de atendimento pela quantidade de profissionais disponíveis para tal. Lidero auditorias de alguns clientes com tipos societários como Sociedade por Ações de capital aberto e fechado, sociedades de grande porte, dou as ressalvas necessárias, e não me importo, nem deveria me importar, se um cliente vai me trocar por outro auditor mais bonzinho, por conta de ressalva em parecer de auditoria (conhecido como “parecer sujo”). Faz parte do jogo. Não disputo o fato, mas como Arthur E. Andersen, por volta de 1913 disse “não há dinheiro suficiente na cidade de Chicago pra comprar minha opinião”. Esse é o espírito que deve reinar na profissão.

Particularizando, eu hoje detenho em minha carteira, CNPJs que isoladamente não representam mais do que 5% da receita da minha firma. Se colocarmos grupos econômicos na jogada, talvez uns 7%. É uma exposição alta, talvez, mas nunca a existência sobre os ombros de alguns colegas, na qual um único cliente pode corresponder a 100% da receita comandada por este profissional. Isso sim é poder de pressão de cliente sobre auditor. E isso independente do tamanho da firma. O profissional está mais exposto.

ISQM1 – Recentes Decisões sobre Controle de Qualidade em Auditorias

Não é de hoje que as auditorias lutam com a necessidade de que um responsável técnico esteja sob o olhar atento de outro. Sempre há essa preocupação, justamente pela pressão que alguns clientes exercem sobre o auditor responsável (principalmente quando em problemas!). A recente norma ISQM1, (International Standard on Quality Management 1 (Previously International Standard on Quality Control 1) – Quality Management for Firms that Perform Audits or Reviews of Financial Statements, or Other Assurance or Related Services Engagements: Padrão Internacional de Gestão da Qualidade 1 (anteriormente denominada Padrão Internacional de Controle de Qualidade 1) – Gestão da Qualidade para Firmas que executam auditorias ou revisões de Demonstrações Financeiras, ou serviços relacionados) é o resultado da evolução do processo de controle interno, pelas firmas de auditoria, sobre os resultados exarados para o público.

Implicam na existência de um Sócio Revisor (em alguns lados chamados de Cold Reviewer, ou Revisor Frio), que não participou dos trabalhos, mas detém qualificação técnica e experiência para tal. Difícil dizer se um Revisor extra conseguiria, na maioria dos casos, identificar e trazer à luz casos que se ligam a fraudes, pura e simplesmente, como os casos da Enron, já mencionados, e escândalos ainda maiores, como o da WorldCom, Vivendi, ou mesmo o caso Petrobrás, que sequer foi tratado como escândalo contábil, e que não tiveram repercussões tão duras (o caso da WorldCom sequer tem mais o verbete, sob “Escândalo”).

A Norma NBC PA 400, “Independência para Trabalhos de Auditoria e Revisão”, Seção 410, fala exatamente sobre isso – independência para trabalho de auditoria e revisão. É só ver lá que ficará claro que o regramento existe e é claro suficiente como para permitir que os auditores façam o que é correto para que seu trabalho seja perfeito, tecnicamente.

O fato é que a profissão evolui e tentar evitar que casos como este aconteçam. No entanto, a profissão, como um todo, fica sempre desprotegida em casos de fraude, pura e simples, já que não é função de auditores independentes investigar fraudes, ou dar conta de situações nas quais foram levados a cometer erros não intencionais, por conta de malversação de dados ou fundos.

Falar com Clareza

Ao escolher falar com clareza, o auditor está sujeito a pressões de seus contratantes e dos seus pares, contadores, dentro das organizações. A alternativa, de ter uma auditoria totalmente “estatal”, como alguns apregoam, é ainda pior – vide o número de escândalos que o poder público é submetido, dia a dia, e a dificuldade de apura-los.

A outra alternativa, à francesa, de ter dois auditores independentes atuando simultaneamente, parece não ter surtido muito efeito ao longo dos anos. Vide o caso Vivendi, já mencionado, no qual dois auditores não conseguiram trazer a público os fatos, e falar com clareza.

O que não podemos como profissionais contábeis aceitar são as alusões a “pequenos” e “grandes” auditores, “primeira” e “segunda” linhas, como se fosse o tamanho de uma organização que determinasse sua capacidade de falar a verdade. Entendo que não o é. Ainda, nós auditores podemos e devemos defender as prerrogativas da nossa profissão, contra a predação constante de outros, interessados sempre nos resultados que a falta de clareza ao falar possa gerar de benefícios ao seus clientes – não falar de um passivo não registrado, não falar de uma ação cujo ganho é menos que certo, não falar que tal ou tal ativo está super ou subavaliado, entre outros casos comuns.

Lidar com pressão tem que fazer parte do treinamento do sócio responsável por uma auditoria. Existência de ressalvas também pode e deve ser parte da vida de companhias – inclusive de capital aberto, a fim de que o público possa julgar até que ponto detêm informações suficientes para tomada de decisões.

À Dra. Patrícia, apenas desejo que ela segregue os fatos em seu julgamento, e não submeta sua opinião ao público sem uma reflexão mais profunda. Sobre o medo pela própria vida e dos familiares, é algo pessoal e intransferível. Desejo a ela e a todos os profissionais nesta situação, muitas bênçãos e proteção.